terça-feira, 31 de maio de 2016

Stonehenge

Atenção: Essa será uma resenha longa e analítica, com um monte de dados históricos e com algumas reflexões pessoais acerca do livro e de seu tema. Resumidamente: Comprido e chato. Mas pelo menos, não vai ter nenhum spoiler, então fiquem tranquilos com relação à isso - já é alguma coisa, certo? 

Primeiro, um pouco com relação à minha história pessoal com esse livro - o resto vai se desenvolver a partir daí: 

Consegui minha cópia de Stonehenge diretamente do Oscar, lá da Montecristo - e depois de já tê-lo agradecido pessoalmente, esse é meu reconhecimento público! De fato, eu queria há muito tempo ler esse livro. Foi através dele que conheci Bernard Cornwell, e sem ter ouvido falar sobre esse livro em particular, anos atrás, eu provavelmente nunca teria tido as conversas que me levaram à descobrir seus outros livros. Então, muito grato, Oscar, por finalmente permitir que eu lesse o livro que me fez conhecer o meu autor contemporâneo favorito!

Fiquei sabendo da existência do livro Stonehenge por conta de uma pesquisa que fiz sobre druidismo alguns anos atrás. Stonehenge era uma das literaturas recomendadas em praticamente todos os lugares que falavam sobre a associação dos Druidas com o círculo de pedras que dá nome ao livro. O que me leva à algumas explicações que me parecem necessárias sobre o monumento megalítico: 

Com relação ao nome: Stone é fácil, uma das palavras mais reconhecíveis do inglês. "Henge", por outro lado, é arcaica, e apesar de ter ganho muitos usos ao longo do tempo, acabou se tornando um termo extinto no inglês - talvez até por ter sentidos demais... Originalmente, ao que parece, o termo era usado como sinônimo de "forca" e suas derivações. Depois, foi associada à erguer, suspender, levantar, pendurar... E finalmente caiu em desuso. Então Stonehenge, numa tradução do inglês arcaico, seriam "pedras suspensas", nome dado por conta das placas em formato de lintel que compõem o monumento. 

Depois, com relação à origem: Esse monumento é da idade do bronze, em algum ponto cerca de quatro ou cinco mil anos atrás - Cornwell aponta que as datações dizem que ele é de cerca de 3.000 A.C., mas alguns pesquisadores dizem que ele é uns mil anos mais recente que isso. Não se sabe ao certo qual o objetivo de sua construção - nem para que finalidade era usado. 

Onde: fica nas planícies de Salisbury, próximo a Amesbury, no condado de Wiltshire, no Sul da Inglaterra - tanto Salisbury quanto Amesbury aparecem no livro de Cornwell: a primeira como uma colina sagrada, a segunda como Cathallo, a cidade vizinha de Ratharrym, que por sua vez é a cidade ao lado da qual é construído Stonehenge. 

No tocante aos Druidas: As pesquisas no local apontam que houve intensa atividade druídica em Stonehenge, mas como os druidas só chegaram àquela região por volta de 1.200 A.C., eles certamente já tropicaram com o local em amplo estado de degeneração, e nada tiveram a ver com sua construção - de fato, eles aparentemente não moveram uma única pedra de lugar! 


Bom, após toda essa conversa sobre Stonehenge, o monumento, vamos à Stonehenge, o livro! 

Antes de mais nada, é importante observar que o livro se passa na idade do bronze, na época da criação de Stonehenge - que, obviamente, não é chamado por seu nome contemporâneo nem uma única vez durante o livro. Isso significa que, pra maioria, nenhum elemento do livro é familiar. Esse é tanto um ponto positivo quanto negativo no livro: se por um lado não reconhecemos nada da cultura com a qual Cornwell lida no livro (afinal, quantos aí leram livros ou assistiram filmes passados na idade do bronze?) por outro lado é absolutamente incrível ver toda a cultura se desfraldando diante dos olhos a medida que o livro avança. 

E acredito que isso tenha muito a ver com a reação das pessoas que eu conheço que tiveram a oportunidade de ler o livro. Todas elas (foram quatro, que eu me lembre) leram uma parte dele e acabaram deixando-o de lado. Sim, elas desistiram dele. Todas forma unânimes: o livro é chato. Eu acredito que o problema do livro seja justamente o cenário. Quem já leu Cornwell sabe que ele faz excelentes descrições de batalhas e retrata muito bem a cultura dos locais onde suas tramas se passam. Mas é importante observar que os livros dele geralmente se passam em ambientes amplamente familiares: Europa do século 19 na série Sharp, ilhas britânicas tomadas por vikings nas Crônicas Saxônicas e a Europa medieval dominada pela igreja na trilogia do Graal. Mesmo quem não é um especialista em história conhece um monte de livros, filmes e jogos passados nesses cenários - ou amplamente baseados nesses cenários - o que nos coloca em uma posição confortável enquanto leitores. Cornwell não precisa descrever cada pormenor de uma cidade medieval pra que nossa imaginação complete o cenário. O mesmo vale para um bando de vikings fazendo um cerco ou mosqueteiros fazendo fumaça com seus rifles. Agora, idade do bronze... Não lembro de nenhum filme ou livro que se passe nessa época - se alguém lembrar, por favor, coloque nos comentários, este blogueiro agradece! 

No entanto, Corwell faz um excelente trabalho recriando o período histórico onde se dá a construção do monumento que nomeia o livro, e apesar de haverem poucas certezas com relação à Stonehenge, seja nos métodos usados para sua construção ou sua finalidade, Cornwell cria uma série de extrapolações, baseadas em pesquisas e em "achismos" pessoais que geram uma narrativa interessantíssima para explicar a Dança dos Gigantes. É interessante notar que, como há pouquíssimos achados arqueológicos ao redor de Stonehenge, Cornwell usa praticamente todos, amarrados de forma magistral. De fato, a trama toda do livro é excelente, com uma história sólida e narrada de modo magistral. 

O livro trata de xamanismo, principalmente, e do medo dos homens com relação aos deuses (ou seja: todos os fenômenos inexplicáveis ao redor deles, que na idade do bronze, eram muitos!) e isso é parte central da construção do monumento. Eu gostei, particularmente, do fato dele ter incluído no livro ilustrações das várias fases da construção do templo, seguindo com exatidão todas as descobertas com relação à ele, mesmo que obviamente tenha extrapolado os motivos e, suspeito, algumas questões cronológicas. Mas, é claro, como se sabe tão pouco sobre o local, não é particularmente importante o quão acurado histórica, religiosa e arqueologicamente o livro está correto - afinal, é uma ficção, não um tratado científico - apesar de, claro, uma boa quantidade de acuidade histórica sempre ser esperado dos trabalhos de Cornwell.

Então, a conclusão sobre o livro, do meu ponto de vista, é de uma excelente narrativa com um cenário muito bem desenvolvido, sobre um tema que não se sabe praticamente nada de forma concreta - e que, apesar de ser o título do livro, serve como pano-de-fundo de uma trama muto mais interessante. 

Eu não recomendaria Stonehenge como primeiro livro de Cornwell para nenhum leitor, exceto aqueles interessados especificamente em um romance passado na idade do bronze (o que provavelmente é algo difícil de encontrar) já que ele parece muito diferente da narrativa mais típica do autor. 

Mas recomendo fortemente a leitura para qualquer um interessado em um cenário totalmente diferente do usual! Pra esses, Stonehenge é um prato cheio! 

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Músicas das Eras Passadas

Não, essa postagem não tem nada à ver com livros ou café. Enquanto pesquisava sobre instrumentos e música antiga pra compor uma ilustração, acabei encontrando algumas informações interessantes com relação ao assunto, e achei que valia uma postagem. 

Eu não sabia - provavelmente por nunca ter pensado muito à sério sobre o assunto, na verdade - mas há uma série de composições musicais que pré-datam o ano zero da história (aquele ano lindo quando, de acordo com a igreja católica, nasceu o meu, o seu, o nosso cristo [sim, esse foi um comentário sarcástico e totalmente desnecessário, só aceita]), vindas de várias partes do mundo. Encontrei algumas delas pelo youtube e realmente gostei bastante do que ouvi! Então, vamos à uma lista com as três que eu considero mai interessantes, em termos históricos: 

A primeira delas é o Epitáfio de Seikilos (sim, o link leva pra versão em inglês da wikipedia, porque lá, além deles manterem o nome original do grego que nomeia o nome da música, além de ter mais informações, como a tradução da letra, que não tem na wikipédia em português). Essa é a mais antiga composição completa conhecida. Apesar de haverem algumas composições mais antigas - como as outras duas sobre as quais eu vou falar aqui - elas estão todas com algum fragmento faltando. O Epitáfio de Seikilos está totalmente completa e legível. Ela foi encontrada em um túmulo próximo à turquia, cuja data varia de algo entre 200 A.C. e 100 D.C., escrito em grego e que, além da letra de uma música, contém sua notação musical. A inscrição final da lápide tem duas traduções possíveis: ou Sekilo à Euterpe, o que implicaria que à musica foi composta pra falecida esposa de Sekilo, mas também pode significar Sekilo, filho de Euterpos, o que pode indicar que é o túmulo do próprio Sekilo. 

No link, há uma versão da música completa (ela tem cerca de 45 segundos de duração), mas eu escolhi uma versão do youtube que me soou mais interessante, por ser um pouquinho mais longa que a original, e diferente das outras versões que eu encontrei, que incluem vários instrumentos e são mais rápidas, esa é mais lenta, o que, pra uma música inscrita em um epitáfio, me pareceu mais adequada. A seguir, a letra original (pra quem quiser acompanhar em grego) e uma tradução livre para o português:

"Hoson zēs, phainou 
Mēden holōs sy lypou; 
Pros oligon esti to zēn 
To telos ho chronos apaitei."

Em português: 

"Enquanto viveres, brilhe, 
Não deixe que nada te entristeça além da medida.
Pois a tua vida é curta, 
E o tempo clamará seu quinhão."


A segunda música dessa postagem na verdade é uma composição dupla, os dois Hinos Délficos (sim, outro link pra wikipedia em inglês, porque esses hinos sequer têm uma entrada em português), escritos entre 128 e 138 A.C. e que, apesar de não estarem completos, apresentam o nome de seu autor, Pythaides de Atenas, o que a torna a mais antiga peça musical do ocidente cujo autor é conhecido. Os hinos são dedicados à Apolo, como o nome indica, a divindade patrona de Delfos e considera uma divindade oracular, que enviava augúrios através de sua sacerdotisa  (Provavelmente todo mundo já ouviu falar do Oráculo de Delfos, não? Praqueles que não conhecem, deixei um link pra facilitar a vida - dessa vez em bom português), e por isso a obra é conhecida como Hinos Délficos. 

As letras do Hino são longas, e há uma versão em inglês nos links, que eu não estou com paciência pra traduzir no momento - google tradutor praqueles que não entendem inglês, me perdoem). 



A última música foi, na verdade, a que me levou às outras, as Canções Hurritas (que também não têm uma entrada na wikipédia em português). Essas composições são um conjunto de músicas em escrita cuneiforme encontrado em tabletes de barro encontrado em Ugarit, no norte da Síria. Do conjunto todo, uma das peças, contendo Hino Hurrita à Nikkal, está praticamente intacta, o que permitiu traduzir a letra e a música de forma quase perfeita - quase, porque a própria escrita cuneiforme não é completamente entendida. 

Além de ser uma interessante peça musical - ninguém espera por aqueles últimos 30 segundos, tenho certeza! - essa peça tem duas características bastante relevantes: A primeira é que ela data de 1400 A.C. - sim, tem três mil e quatrocentos anos de idade! - e a segunda, e ainda mais notável, é que ela usa uma escala musical heptatônica (conhecida pelo menos desde o século 18 A.C. através de pelo menos três tabletes de barro Acádicos) mas também diatônica, uma escala que, até a descoberta dos tabletes contendo as Canções Hurritas, acreditava-se ter sido criada por Pitágoras, no século 4 A.C. - ou seja, mais ou menos mil anos depois das Canções Hurritas terem sido escritas!   

Não achei muitas informações relativas à esse pequeno mistério musical, mas tenho certeza que deve ter algumas interessantes teorias pela internet afora com relação à isso (provavelmente envolvendo aliens) ou não. 

Sem mais delongas, a mais antiga peça musical conhecida:



Boa viagem musical, e até a próxima postagem - provavelmente sobre café ou livros! 

terça-feira, 17 de maio de 2016

A vida, o Universo e Tudo Mais

Esse é o livro que conclui a primeira trilogia - dentro da trilogia de cinco livros... - do Mochileiro das Galaxias. Foi bom ter feito a resenha dos outros dois volumes separadamente, porque, definitivamente, esse livro é bem diferente dos outros. Eu ainda não li o quarto e o quinto livros da trilogia, mas imagino que a narrativa do senhor Adams deve mudar bastante nos dois últimos volumes, considerando como A Vida, o Universo e Tudo Mais se desenrola.

Esse livro parece mais sóbrio que os outros dois. Tão sóbrio quanto algúem que bebeu uma duzia de dinamites pangalácticas de canudinho, claro, mas os dois livros anteriores parecem ter sido escritos dentro de uma festa voadora que perdeu o controle. 

O livro tem, de fato, uma trama quase lógica - novamente, dentro da lógica distorcida do cenário - e se os outros dois livros não fizessem um trabalho tão bom em esmagar o cérebro do leitor entre uma fatia de limão e uma barra de ouro de bom tamanho, seria possível até ler esse livro juntando as peças pra entender o que está acontecendo. Mas como os eventos todos dos livros anteriores acontecem de modo aleatório e sem muita explicação, eu basicamente fui lendo os acontecimentos da trama e pensando que, dentro da maluquice do universo uma vez presidido pelo senhor Zaphod Beeblebrox, aquilo fazia tanto sentido quanto todo o resto. Além disso, a peça pra entender o mistério reside - de forma aparentemente aleatória -no penúltimo capítulo do livro, então mesmo um leitor lendo o livro de maneira lógica - eu adoraria ver isso - não conseguiria juntar todas as peças até o finalzinho do livro. 

A trama do livro segue nossos "bravos heróis" na tentativa de impedir que uma terrível civilização, separada do resto do universo milênios atrás, seja libertada de seu exílio temporal, já que o grande objetivo dessa civilização é nada mais nada menos do que destruir todo o resto do universo. Um caso extremo de xenofobia, devo observar. 

A chave pra a libertação do planeta Krikkit - que é onde vive a tal civilização - é composta por cinco itens de materiais variados que estão espalhados pelo universo. Para encontrar os itens, Arthur Dent e seus companheiros amalucados precisam voltar à terra antes dela ter sido destruída, visitar uma festa que está rolando há 20 anos - e durante a viagem Arthur é sequestrado por aqule vaso de petúnias lá do primeiro livro. Não pergunte, só lendo o livro pra entender - e finalmente se dirigem para Krikkit depois de descobrirem que os robôs brancos assassinos que estão reunindo as peças da chave já conseguiram todas as cinco peças. 

A coisa toda termina com a descoberta de que a civilização de Krikkit foi manipulada o tempo todo por um super-computador meio morto que falhou em sua missão de destruir o universo eons atrás, e decidiu que precisava concluir sua missão - mesmo depois de ter sido vaporizado pelos seus criadores. Sim, é tudo muito maluco, e por conta disso, é difícil tentar manter um foco realmente lógico na leitura, como eu disse lá em cima. Mas vale a pena tentar, de qualquer forma. 

No fim, tudo termina bem. Arthur Dent continua sendo o ser humano mais lamentável do universo, Trillian - que é a única outra humana do universo... - ainda é uma personagem que eu teria gostado de ver mais nas histórias (cara, ela arranja um encontro com o Thor, como não gostar de uma mulher assim?), Ford continua tão apático como sempre, Zaphod provavelmente vai se meter em muitos problemas e Marvin.... Bom, eu admito que não sei  que foi feito do Marvin no fim do livro. Mas provavelmente está se arrastando e suspirando em algum lugar do universo, como sempre. 

A Vida, o Universo e Tudo o Mais não é tão divertido quanto seus dois antecessores, e considerando que a história teria terminado tão bem no final do Restaurante no Fim do Universo quanto terminou no final desse livro, concluo, pessoalmente, que esse livro é bem descartável, na verdade. Claro, dentro d trama toda do cenário. Enquanto leitura de ficção nonsense, apesar de um pouco cansativo - provavelmente porque eu li os três livros um atrás do outro, o que provavelmente teve algum impacto permanente nas minhas terminações nervosas... - é um bom livro. Não excelente, mas bom. 

De qualquer forma, três já foram, faltam dois. Provavelmente vou pegar alguma coisa diferente pra ler antes de concluir a trilogia de cinco, mas certamente resenhas dos últimos dois livros vão aparecer por aqui. 

Enquanto isso, boa viagem e não esqueçam de carregar suas toalhas! 

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Precisamos de mais lobos

É interessante como linhas de raciocínio podem ser totalmente tortuosas e nos levam as vezes à reflexões profundas.
A imagem que iniciou essa pequena reflexão
Esses dias, enquanto estava tendo umas conversa sobre Mundo das Trevas (como Lobisomem é legal e Vampiro é uma bosta) com o meu caríssmo Gafanha, postei uma imagem da Barbie e do He-Man no facebook. O Gafanha, como resultado, veio me perguntar se eu já tinha assistido True Detective. Eu fiquei um pouco confuso com a pergunta. O que diabos Barbie, Lobisomens e séries de detetive têm em comum? Bom, a resposta foi que, basicamente, como o Mundo das Trevas tem algumas coisas meio Chutulhianas, o cérebro do Gafanha lembrou de um diálogo de True Detective (que tem alguns leves elementos Chutulhianos nele) sobre programação humana (que é basicamente a lógica por trás da imagem da Bárbie e do He-Man) e como nossa consciência na verdade é um erro de evolução. 

(a conversa é essa, até mais ou menos 3:30)

Entramos em uma conversa sobre como essa lógica é covarde porque, basicamente, joga a culpa pelos erros humanos em uma mutação genética mal-fadada e permite que o sujeito simplesmente foda, coma e defeque sem precisar ponderar sobre a própria existência ou nas consequências dos seus atos, no fim do dia. 

Mas há um ponto de validade nessa filosofia: Nossa capacidade de ponderar e refletir vale muito pouco com relação ao dano que nós causamos ao planeta - e à nós mesmos - devido à nossa capacidade "superior" de raciocínio. 

Claro, isso é um enorme erro humano. Em nosso imenso egocentrismo e mania de nos colocarmos como uma parte absolutamente vital do planeta, nós realmente achamos que estamos causando algum impacto real sobre a Terra - o que é, no máximo, uma ficção megalomaníaca. De fato, o homem existe como civilização por um período de tempo ridículamente pequeno. Quando nos formos - e eu não duvido que nós vamos, de uma forma ou outra - a Terra vai lembrar de nós como uma infecção lamentável que durou uns dois ou três dias. 

Oh, sim, nós causamos impacto no ecossistema. O homem realmente extinguiu direta ou indiretamente várias espécies de animais ou plantas. Mudamos a paisagem do planeta. Somos maus em nosso egoísmo. Sem nós, o planeta seria muito melhor, e as coisas mais estáveis, e o ecossistema muito mais feliz, certo?

Errado. 

Essa é outra grande bobagem desenvolvida pelo nosso senso exagerado de auto-importância. Os dinossauros são a prova viva (ou nem mais tão viva assim, enfim) de que nós definitivamente fazemos muito menos estrago do que algumas catástrofes naturais. O meteoro (ou seja lá qual fenômeno) que extinguiu osa dinossauros, as eras do gelo (foram 5 nosa últimos 2 milhões de anos), erupções vulcânicas mostruosas... todos esses efeitos causaram a extinção de várias espécies e mudanças brutais na superfície do planeta. E adivinha? Humanos não tiveram nada a ver com isso!

Em um exemplo em menor escala, mais fácil de compreender, temos as mudanças dos rios causadas pela reitegração de lobos no parque de Yellowstone:

(sim, a tradução apresentada na legenda é bem ruim)

Nós damos muita importância para nossa própria existência e aos impactos dela no planeta. Falamos, agora, muito sobre o aquecimento global e como isso vai ser ruim. Vai ser ruim pra nós! Os humanos vão passar trabalho - e as espécies que têm o azar de serem nossas contemporâneas - mas isso não significa que vamos acabar com o bendito planeta! Raios, se jogarmos bombas nucleares em todos os países do mundo, extinguirmos toda a vida na superfície da Terra, provavelmente teremos formas de vida diferente aparecendo por aí em alguns anos depois! Isso sem contar que as criaturas de profundidade abissal provavelmente nem vão tomar consciência do que está acontecendo aqui em cima... 

Humanos não são o mal da Terra. Nós não somos uma coisa terrível que causa mudanças irreversivelmente tenebrosas ao planeta. Nós somos parte integral do sistema ecológico do planeta, e vamos viver e morrer e deixar de existir (ou sei lá, migrar pra outros planetas) e a Terra vai seguir existindo, bela e faceira, por muito tempo depois. 

"Cara, todo esse papo pseudo-filosófico tem uma finalidade, ou é só uma reflexão babaca?" alguém pode estar pensando. 

Na verdade, é só uma reflexão babaca, mesmo. Mas ela pode ter uma finalidade útil: Não pense em como tudo está errado e sofra profundamente com isso. Foda-se. Viva uma vida feliz e deixe a humanidade matar à sí própria. Nós não temos importância em escala planetária sequer como espécie, quanto mais como indivíduos! Viva e deixe viver. Aproveite a vida, e pare de pensar nas coisas erradas que os outros fazem. Seja legal com seus conhecidos, dê um exemplo pelo qual tu possa ser lembrado no futuro, e não fique pensando na pequenesa da própria existência diante do resto da humanidade, do planeta, do universo. Esses pensamentos existenciais não têm resposta e não levam a lugar algum - exceto, as vezes, a salas acolchoadas em instituições públicas ou à bancos duros de edifícios religiosos. 

Viva e deixe viver. 

O tempo cuida de todo o resto. 

quinta-feira, 5 de maio de 2016

O Guia do Mochileiro das Galáxias e O Restaurante no Fim do Universol

Apesar de ter lido a trilogia original do Guia do Mochileiro das Galaxias há alguns anos atrás, isso foi antes do início da existência do Café com Letra, e eu achei que era hora de reler os livros pra fazer a devida homenagem aqui no blog - na verdade, os livros ficaram me tentando na estante por alguns dias, por um desses motivos insondáveis da psiquê humana, e eu acabei decidindo reler os miseráveis.

Eu ia escrever uma única resenha para a trilogia original inteira - e separar apenas o Até Mais, Obrigado Pelos Peixes e Praticamente Inofensiva em resenhas separadas - mas quando cheguei no final do Restaurante no Fim do Universo, fiquei com uma sensação que se a história tivesse terminado ali, estaria de bom tamanho - o que não acontece no fim do primeiro livro. 

De fato, uma das coisas mais notáveis no Restaurante no Fim do Universo é o tom sóbrio, quase melancólico e extremamente filosófico que o livro apresenta perto do fim. O encontro com o homem que rege o Universo e as interações de Arthur e Ford com os Golgafrinchanos na terra pré-histórica são cheios de reflexões e muito menos da comicidade nonsense que o resto dos dois primeiros livros apresentam. 

Alias, outra coisa notável ao longo da história é que Adams para de usar termos "técnicos" que não fazem o menor sentido (que recheiam o primeiro livro de forma quase irritante) e passa a usar terminologias que, mesmo sendo absolutamente esdrúxulas, fazem todo sentido dentro de si mesmas, dentro, é claro, da lógica distorcida do próprio cenário dos livros. A mesma lçógica aparentemente se estende ao terceiro livro, e parece que Adams para de simplesmente soltar termos pseudo-científicos de modo aleatório e passa a pensar um pouco mais em criar uma concisão nessa parte do cenário a medida que os livros avançam. É pena que ele não tenha dado meia volta e reestruturado seus primeiros termos técnicos também, o que teria aumentado o prazer de tentar entender a lógica por trás de nomenclaturas bizarras ao invés de simplesmente pular elas depois de perceber que elas obviamente não fazem sentido algum. 

Ah, sim, eu deveria falar sobre o conteúdo do livro, certo? Bom, não. Todo mundo conhece a história do Guia, imagino eu, mesmo porque, até um filme (que eu não vi) tentou adaptar a obra pro cinema. Mas ok, dá pra fazer um resumão: Nos idos da década de 1980 a terra foi demolida pra dar lugar pra uma rota de trânsito espacial, e só dois humanos sobreviveram à isso: Arthur Dent, que pegou uma carona com um amigo seu que era na verdade um náufrago galático na Terra e Trillian, que saiu do planeta meio ano antes do seu fim por ocnta de uma carona do presidente galático, Zaphod, que eventualmente rouba uma nave com motores de improbabilidade e acaba reunindo todos os quatro personagens em busca de.. Bom, é difícil saber o objetivo deles, na verdade. Os planos de Zaphod - o "líder" da tripulação - são tão bizonhos que eles param de fazer sentido a medida que são colocados em movimento. De fato, o livro é, basicamente, uma sucessão de acontecimentos mais ou menos aleatórios que empurram Arthur de um lado pro outro durante a trama, aparentemente ser haver um grande plano por trás, apenas uma infinita sucessão de sub-plots. Essa completa falta de objetividade, no livro, é, pra mim, o ponto forte da história. Ela passa um sentimento permanente de "que porra vai acontecer agora?" Algumas coisas que acontecem são muito divertidas, outras, nem tanto, mas ainda assim, dentro da narrativa frenética do livro, tudo fica extremamente divertido de ler. 

Outras coisas interessantes de se notar no livro são as amarradas de ponta completamente inesperadas. Um evento completamente aleatório em algum momento - que parecia só uma piada absurda naquele momento - acaba por se tornar um evento que efetivamente tem uma continuidade em algum outro momento da trama. É meio assustador pensar em como Adams mantinha controle sobre a quantidade de bizarrices que ele estava escrevendo! 

O final do Restaurante no Fim do Universo termina com uma sensação de fim de história, e teria sido um fim interessante pra uma história divertida. Como o Guia não é exatamente um livro universal - a falta de uma trama mais complexa ou, na verdade, a inexistência de qualquer tipo de linearidade, que afinal de contas é uma obra de humor nonsense - pode facilmente frustrar alguns leitores. Além disso, é de conhecimento geral que os últimos dois livros da Trilogia de Cinco não tem a mesma qualidade dos primeiros três - eu ainda não sei, já que não li esses dois. Considerando isso, acho que ler os dois primeiros livros, apenas, é uma opção para aqueles que considerarem a leitura um pouco, digamos, pesada - já que roteiros nonsense são extremamente cansativos de acompanhar por muito tempo. 

Claro, pra quem gosta de nonsense, é um prato cheio! 

Praqueles procurando um pouco de variação na rotina de leitura, recomendo fortemente! 

quarta-feira, 4 de maio de 2016

The Quantum Thief

Catei esse livro pra escutar por conta de uma entrevista que vi com o Scott Brik, que foi o sujeito que narrou a trilogia original de Shannara, dizendo que esse foi o livro que ele mais gostou de gravar. Como eu estava procurando coisas dele pra ouvir - o cara é um narrador muito bom! - e sendo um livro de ficção científica, fui atrás sem me importar com o pequeno dilema moral que me acompanha sempre que eu pirateio alguma coisa. Acontece, as vezes.

E, de fato, esse livro valeu muito a pena! É uma excelente obra, ficção científica purinha, com uma construção de cenário extremamente precisa e funcional, e cuja trama vai se amarrando com o cenário de forma absolutamente magistral!

O cenário, pra começar a falar do conteúdo em si, é extremamente complexo. De fato, catei até um pequeno glossário de termos que aparecem no livro pra me acompanhar durante a "escutação" da obra - por mais que tudo seja bem explicado no livro, ter um glossário à mão, particularmente para os termos que aparecem com menos frequência é extremamente útil!

O cenário principal do livro é na cidade de Oubliette, em Marte, uma cidade que precisa se manter em constante movimento sobre a superfície do planeta pra fugir de uma praga tecnologica conhecida como phoboi que rondam a superfície estéril. A população humana do cenário, depois que a Terra foi abandonada séculos antes do início da trama em um evento cataclísmico (não explicado nesse livro, mas provavelmente em uma de suas sequencias) conhecido como O Colapso, vivem em Oubliette e outras cidades móveis em Marte, assim como outras imensas colônias em outros planetas do sistema solar e em estações espaciais.

Como se pode perceber, o nível de tecnologia do cenário é muitíssimo avançado. Um desses avanços mais importantes é que, agora, os humanos são capazes de fazer upload de suas consciências e memórias, passando-as para novos corpos como bem desejarem. Obviamente, a morte não é um problema permanente no cenário, mas sim o tempo que se vive e como gastá-lo. Um dilema extremamente bem retratado no livro, apesar (ou talvez exatamente pelo fato) de ninguém falar no assunto de forma muito direta.

A trama do livro segue os passos de um ladrão, como o nome do livro indica, Jean Le Flambeur, que precisa roubar suas memórias de volta. Na verdade, ele precisa roubar outra coisa (que seria um spoiler horrendo revelar o que é aqui nessa resenha, e eu prefiro geralmente não fazer isso) como plot principal do livro, mas a maioria da trama se desenrola ao redor das suas memórias "perdidas" que ele precisa resgatar para poder ser capaz de cometer o crime para o qual é contratado.

A narrativa é ágil, com interlúdios que parecem não fazer sentido no meio da história, mas que vão se amarrando à trama principal com uma precisão magistral.Os personagens são extremamente bem construídos, todos eles muito carismáticos de uma forma ou outra, e o cenário é de explodir o cérebro do leitor. De fato, eu escutei o livro duas vezes na sequencia, porque depois de chegar ao final do livro, eu queria entender de forma mais precisa alguns detalhes que achei que tinha perdido pelo meio do caminho (e tinha mesmo! É muita informação, acreditem!) e também, preciso admitir, porque cometi um erro na primeira vez que ouvi o livro e "perdi" 7 capítulos no meio da leitura. Uma pequena sacanagem que meu celular me aprontou.

Enfim!

O livro vale severas horas de discussão, e praticamente tudo dentro dele (personagens, tecnologia, cenário, trama) merece elogios rasgados! Então, por favor, alguém por aí leia (ou ouça) o livro pra eu poder conversar com alguém sobre ele! É divertimento garantido!

Leitura, obviamente, fortemente recomendada!