domingo, 28 de novembro de 2010

Bento


Ganhei de presente da minha avó, no último dia da Feira do Livro de Pelotas de 2010, entre outros livro, a trilogia Bento, O Vampiro Rei vol. 1 e O Vampiro Rei vol. 2, de André Vianco, autor paulista que eu já conhecia do livro Sétimo - que embora eu não tenha lido na íntegra, tive a oportunidade de dar uma "passada de olhos" na casa de um amigo, que me recomendou muito o livro, dizendo que estava adorando, mas que, como não tinha terminado de ler, não podia emprestar.
Admito que fiquei curioso com o livro na época - lá em meados de 2005, 2006, creio eu - mas só curioso. Não fui atrás.

Durante o último dia da Feira do Livro, depois de termos passeado bastante e comprado alguns livros, principalmente em cebos, Estavamos passando por uma banca, quando lí o nome do autor na capa do Senhor da Chuva. Comentei que já tinha ouvido o nome, e o sujeito da banca, prontamente, apresentou esses três livros que ganhei, com uma "promoção de fim de feira" ou algo que o valha. Cada um dos livros - os primeiros dois com mais de 500 páginas cada um, e o terceiro com 400 páginas! - saiu por menos de R$ 30,00! Eu já estava fazendo a contabilidade pra comprar os livros, quando a minha avó decidiu me dar os livros de presente!

Acabei de terminar Bento, o primeiro livro da trilogia, que, até onde eu sei, não tem nenhuma ligação com os livros anteriores do autor. Vianco nos apresenta neste livro uma versão de Eu Sou a Lenda misturando Matrix e a Távola Redonda.

Aqui vai um resumão do cenário (vai ter spoiler, aviso aos navegantes!):
Trinta anos depois de uma apocalíptica noite em que metade da população mundial caiu em um sono místico, os humanos lutam para vencer os vampiros que despertaram durante esta fatídica noite. A medida que vão despertando, os humanos que adormeceram na Noite das Trevas podem vir como humanos normais, vampiros ou Bentos. Os Bentos são humanos com poderes sobrenaturais "acionados" exclusivamente na presença de vampiros, quando se tornam verdadeiros liquidificadores de sangue-sugas. Desde o começo do pesadelo, as mulheres ficaram estéreis, mas os humanos deixaram de sofrer qualquer tipo de doença, e mesmo aqueles que estavam doentes quando as pessoas adormeceram se curaram rapidamente dos males que sofriam. Além disso, ondas de rádio deixaram de fazer parte da física desde a Noite das Trevas, o que debilitou bastante as comunicações. Há ainda uma profecia que diz que, quando trinta destes Bentos se reunirem, então o trigésimo Bento desencadeará quatro milagres que livrarão a raça humana dos temíveis vampiros.

Pois é, o cenário até é interessante - apesar de algumas incoerências. Mas não é funcional. A começar pela bitolação católica da coisa. Apesar do "Bispo" - o profeta do livro - dizer que nada desse apocalipse estar na bíblia, que estes acontecimentos se passam durante "cochilo de Deus", que nenhum dos Bentos é abençoado por Nosso Senhor, os Bentos usam armaduras medievais muito semelhantes às usadas pelos cruzados, com grandes cruzes em alto-relevo em seu peitoral de metal, e medalhas de São Jorge. Os milagres são desencadeados por orações de Pai Nosso, e água benta é arma contra vampiros...

Enfim, nada disso faz lá muito sentido.

Além desta questão, outra característica do livro que me incomodou bastante foi que ele é um livro extremamente machista. Os Bentos são todos homens. O profeta desse novo mundo é um homem. Até os vampiros mais importantes são homens! Nenhuma mulher tem qualquer importância real na trama - a doutora Ana só aparece nos primeiros e últimos capítulos do livro, apaixonando-se por Lucas, mas sem nenhuma relevância na trama além de de ser a princesa encantada do valente cavaleiro-mor. Temos também uma vampira caolha - cujo nome me fugiu agora - que eu achei que seria uma peça importante, mas que acaba sendo eclipsada até mesmo por um de seus próprios comandados, que recebe um papel importante no final da trama - enquanto ela é sumariamente esquecida.

Há ainda algumas questões não explicadas no livro. Os trinta Bentos, por exemplo, são todos brasileiros. Embora não seja mencionado em qualquer outro lugar do livro como estão as coisas nos outros países, são os milagres desencadeados por eles que iniciam a revolução do extermínio de vampiros, o que nos leva a crer que apenas em terras tupiniquins haviam os tais Bentos. No final do livro é dito que o resto do mundo iniciou a caça aos vampiros, mas eu nem imagino como isso seria possível, já que a própria defesa das fortalezas geralmente consegue ser bem sucedida graças aos bentos, e caçar os monstrengos é visto como uma ação suicida.
Mas, embora sejam brasileiros, eles não estão em todo o território nacional. Aparentemente as terras do sul do país todas caíram nas mãos dos vampiros. Em determinado momento do livro, quando decidem reunir as trinta espadas, os Bentos saem de são paulo, vão ao Rio de Janeiro, Minas gerais, e depois nordeste. Nada abaixo do centro do país parece ter sobrevivido aos vampiros. Não há bentos nem ao sul, nem no noroeste - embora no noroeste realmente os vampiros devam ter uma vantagem, já que eles são excelentes braquiadores (essa palavra existe em português? Sei que existe em espanhol e inglês, mas não tenho certeza se existe em português...) e duvido que a população humana daquela região tenha conseguido conter o seu avanço. Mas no sul, nem vou tentar entender qual o motivo de não haver população humana - ou, ao menos, Bentos.
Finalmente, os vampiros com aparente inteligência mas incapazes de raciocinar são de dar dó. Eles não usam armas de fogo (mas arcos-e-flechas, algumas vezes), preferindo correr babando pra cima de muralhas bem protegidas das fortificações, escolhendo sempre as mesmas rotas de ataque, desconsiderando totalmente a validade da organização em seus planos de ataque. São capazes de pensar como qualquer outro, são mais rápidos, mais fortes e mais resistentes que os humanos... E caem como moscas diante de um fazendeiro armado com um fuzil! As cenas de resistência são patéticas! Os vampiros, teoricamente mais rápidos que humanos, são incapazes de lidar com qualquer soldado, mesmo em vantagem numérica, contra um único combatente - mesmo que este esteja armado apenas com um rifle com baioneta. Eles são capazes de chingar, fazer gracinhas, e morrer em seguida. Os vampiros são exultados à todo instante como caçadores, predadores, velozes, mortais... Só que nunca demonstram isso. Seria melhor se o autor tivesse usado zumbis acéfalos... Teria um mínimo de coerência.

Enfim!

Como ponto positivo, as cenas são muito bem descritas, e é possível "ver" algumas das "cenas" do livro. No entanto, muitas vezes o autor usa um excesso de frases curtas, que criam tensão, mas em parágrafos muito longos, o que acaba tornando algumas partes do livro bastante massantes.

Não gostei do livro. Ficou bem abaixo do que eu esperava. Espero que O Vampiro Rei (vol 1 e 2) sejam um pouco melhor, mas tenho cá minhas dúvidas.