sábado, 19 de maio de 2018

Crossroads of Twilight

Décimo primeiro volume da série Wheel of Time - como eu sempre deixo claro, considerando New Spring como o primeiro livro, ao invés de um "livro zero" ou algo assim - de Robert Jordan. Como o resto da série até aqui, e provavelmente até o final, apreciado em audio.

Não há muito o que dizer sobre esse livro. Quase todo ele ocorre simultaneamente com os eventos do livro anterior, Winter's Heart, e absolutamente nenhuma trama é levada adiante. O livro se resume basicamente à desenvolver sub-tramas auto-contidas, que se resolvem dentro do próprio livro, e não desenvolve em nada qualquer dos conflitos existentes nos livros anteriores. Os personagens simplesmente ficam sentados lá onde estão, resolvendo suas vidas diárias ao longo do livro todo. De fato, algumas passagens são particularmente hilárias, com cenas inteiras revolvendo sobre um banho quente ou chás e massagens para resolver dores-de-cabeça. Todos os personagens terminam o livro exatamente no mesmo ponto em que estavam no livro anterior, e apenas um pequeno gancho aparece no final do livro, num momento de imbecilidade completa de um personagem que decide fazer as coisas do jeito mais idiota possível - e não, não é o Matt!

Os pequenos dramas cotidianos sequer servem para ampliar o cenário estabelecido, e revolvem geralmente ao redor dos pequenos problemas dos personagens com suas resoluções anteriores. Basicamente, todos estão "decidindo o que fazer" ao longo de toda a trama do livro.

Crossroads of Twilight é no mínimo ignorável, e na verdade exceto para aqueles que, como eu, desenvolveram uma certa síndrome de Estocolmo com a série, é totalmente descartável. Uma pena.

terça-feira, 8 de maio de 2018

Quatro Soldados

Comprei esse livro "enganado" pela capa. Em uma visita à São Francisco de Paula, fomos à uma livraria da cidade, e acabei passando o olho por esse livro. Li a parte de cima da capa, uma citação de Daniel Galera, assumi que o livro era dele, por uma dessas desatenções da vida. Quando, depois de visitar várias sessões da tal biblioteca, chegou a hora de escolher um livro para comprar, decidi por Quatro Soldados, pois já havia lido um livro de Galera, além de uma HQ, e seus outros livros já me foram recomendados por mais de uma pessoa.

Não dei mais muita atenção ao livro ao longo da minha visita à serra, e só voltei À ele ao chegar em casa. E foi, admito, com certa decepção, que ao desembrulhar o volume me dei conta que o autor era um total desconhecido pra mim, um tal Samir Machado de Machado. Essa pequena decepção fez com que o livro acabasse sendo ignorado em favor de um livro de contos que já estava na minha pilha de leitura.

Pois bem. Sendo um livro curto - nem 300 páginas - acabei decidindo dar uma chance ao autor desconhecido - a premissa do livro ainda parecia bastante interessante, afinal.

E que grata surpresa eu tive!

Quatro Soldados pode ser considerado uma espécie de "livro de contos" com quatro narrativas separadas, interligadas entre si, mas completamente independentes. Todas se passam no Brasil do século 18, o que, devo admitir, foi uma escolha audaciosa do autor, já que, honestamente, para o leitor de ficção e fantasia brasileiro, a história de nosso próprio país tem pouco atrativo e nós preferimos ler histórias de "terras exóticas" ou nos concentrar nos cenários mais tradicionais europeus de onde vem a maior parte de nossa influência nessa área de literatura. Eu, pessoalmente, já li alguns livros de fantasia e ficção científica nacionais, e tenho que admitir, não gosto, em geral, do modo de escrita de meus conterrâneos, infelizmente. Principalmente quando suas histórias se passam em terra brasilis.

Mas, felizmente, Samir Machado de Machado é uma exceção à essa regra. Utilizando termos antiquados em sua escrita e passando suas histórias num território brasileiro ainda muito distante do 7 de setembro de 1822 que criaria algum tipo de identidade nacional, o autor faz uso extremamente eficiente de folclore e elementos fantásticos em conjunto com eventos históricos para criar um clima de identificação e ao mesmo tempo estranheza com o cenário e seus personagens.

Cada um dos quatro segmentos do livro tem, ainda um clima completamente distinto dos demais - steampunk, mythos Chutulhianos, romance de capa-e-espada e mistério investigativo, tudo com um ar de pulp extremamente bem incorporado.

Não vou me alongar no conteúdo da trama - ele está presente na contracapa do livro, afinal - mas posso dizer, sem receio, que vale bastante a pena a leitura.

Definitivamente esse livro me fez ter interesse em procurar outras obras do autor! Leitura fortemente recomendada! 

terça-feira, 10 de abril de 2018

às Portas da Fantasia

Esse livro foi uma compra fácil. Contos, meu tipo de leitura favorita, de Robert Bloch e Ray Bradburry, dois autores de quem eu gosto do trabalho. O organizador do livro, Kurt Singer, é um total desconhecido pra mim, mas ele fez um excelente trabalho ao selecionar contos da Weird Tales Magazine - pelo que pude notar, todos os contos vieram de lá.

Apesar de ser, teoricamente, um apanhado de contos de ficção científica (pelo menos é o que diz na capa brasileira), Às Portas da Fantasia é uma coletânea de contos de terror e horror.

São, ao todo, dez contos, quatro de Bradbury (Um Delírio Metaléptico, apesar de estar creditado à Bloch no índice, na verdade é de Bradbury) e seis de Bloch.

Os quatro contos de Bradbury são completamente desbalanceados. Enquanto O Morto simplesmente parece deslocado dentro do livro, sendo mais uma viagem filosófica do que qualquer outra coisa, Os Microespiões e Delírio Metaléptico são bons contos, exatamente dentro do que se espera dentro da narrativa do autor - eles criam tensão ao longo da história e apresentam um final bem amarrado e eficiente. Bradbury pra quem gosta de Bradbury. Já O Manipulador... Eu jamais imaginei algo tão absolutamente sombrio como esse conto vindo de Bradbury. Definitivamente material de pesadelos!

Enquanto os contos de Bradbury trazem elementos de horror com temas psicológicos, Bloch trabalha com elementos folclóricos mais tradicionais do terror. Os Títeres se Vingam traz uma revisão contemporânea do mito judaico do Golem, A Vez do Lobo é uma história sobre lobisomens com a dose certa de vísceras, sangue e reviravoltas inesperadas, A Maldição dos Druidas trabalha com maldições ancestrais e Uma Questão de Regulamentos cria uma divertidíssima narrativa ao redor da bruxa que faz pactos com o demônio.

Dois dos contos, no entanto, merecem um pouco mais de atenção por lidarem com um folclore que hoje pode ser considerado clássico, o Horror Cósmico. Sim, estamos falando de Chutullu Mythos aqui.

Eu, honestamente, não sabia que Robert Bloch era parte do Lovecraft Circle e foi com certa surpresa que comecei a ler O Campanário das Trevas por conta da quantidade de informações contidas ali que saíram de contos de Lovecraft. De fato, o próprio Lovecraft é uma personagem do livro! Depois de ler a história, fui atrás de mais informações. Acontece que, pra além de descobrir que Bloch era membro do Lovecraft Circle, descobri uma parte ainda mais interessante (eu diria na verdade excitante!) com relação à essa história:

Acontece que, em 1935, influenciado pelas histórias de Lovecraft, Bloch resolveu experimentar um pouco na área do Horror Cósmico e escreveu o conto The Shamlbler from the Stars. Nele, um investigador descobre que as histórias contidas nos contos de Lovecraft não são apenas fantasias malucas, mas sim baseadas em "coisas reais". Um ano mais tarde, Lovecraft escreveu um conto que dava continuidade à narrativa, The Haunt of the Dark, onde ele inclui um tal Robert Blake, baseado em Bloch (Block, Blake, do you got it?) como narrador da história. Acontece que O Campanário das Trevas é a terceira parte dessa história, lhe servindo como final. Além disso, há uma enorme quantidade de referências à outras histórias Lovecraftianas no conto: Nephren-Ka é mencionado no conto The Ousider, e o Trapezoedro Cintilante é mencionado em Whisper in the Dark e At the Montain of Madness. Além disso, os Homens-Serpente de Valusia tiveram acesso ao Trapezoedro Cintilante, o que cria uma ligação inegável entre as histórias de Kull (e portanto do cenário de Robert E. Howard) com os Mythos.

O Campanário das Trevas é muito bem escrita, criando um clima claustrofóbico e deixando o leitor num clima de tensão permanente. Certamente vou procurar os dois primeiros contos e então voltar à ler esta história! Tenho certeza que vai valer a pena!

Finalmente, O Vampiro Zombeteiro (tradução extremamente infeliz de The Grinning Ghoul) apresenta mais uma história fortemente ligada aos Mythos, mas aqui de forma, digamos, mais sutil, através de referências à vários livros, personagens e entidades de outros contos de Lovecraft (como os livros De Vermis Mysteriis, Fábulas de Nysrlatotep e o próprio Necronômicon, além de entidades como Primaz Saboth e Byagoona). O conto tem uma estrutura clássica dos contos Lovecraftianos: Um profissional equilibrado confrontado com uma verdade que não pode compreender. É o tipo de conto que qualquer fã de Lovecraft vai gostar muito!

fora um conto meio desencontrado, às Portas da Fantasia é uma excelente coletânea de horror e terror.  Contos com temas clássicos e aquela pitada de horror cósmico que deixa o prato mais saboroso de ser apreciado!

Leitura fortemente recomendada!

sexta-feira, 30 de março de 2018

Winters Heart

E chegamos ao décimo livro da série Wheel of Time (estou contando em ordem cronológica, então estou incluindo New Spring como o primeiro livro). Tive que ouvir partes desse livro mais de uma vez - particularmente no ultimo terço dele - porque tem MUITA coisa acontecendo ao mesmo tempo, o ponto de vista muda de um personagem pro outro com muita frequência e é difícil de acompanhar todas as mudanças de perspectiva que ocorrem ao longo dos últimos capítulos.

Agora, o que é mais bizarro sobre esse livro é o fato de, apesar de haver muita coisa acontecendo ao mesmo tempo, a impressão é que o livro simplesmente não anda. A maioria do livro se passa em resoluções de tramas secundárias - mesmo no caso do próprio Rand - e há partes do livro que simplesmente parecem estar ali pra encher o saco do leitor... E sim, há um grande acontecimento no final do livro, que ocorre de manira como eu mencionei acima, meio confusa, e termina com um "PUF!" . Repentinamente. A impressão que fica é que Jordan estava simplesmente sem vontade alguma de escrever, e ao perceber que já tinha material suficiente pra encher um livro, simplesmente escreveu um evento importante - que já estava indicado no livro anterior - o mais rápido que pode pra "fechar" o livro.

Certamente, o livro mais fraco da série até aqui. Mas como ainda temos mais cinco livros pela frente, vamos adiante!

Ah, e adiante, algumas notas pessoas pro Domênico do futuro saber o que acontece nesse livro. Então leitor, fique avisado:

***** REVELAÇÕES SOBRE A TRAMA ADIANTE! *****

Como eu disse, nada demais acontece no livro, exceto pelo final. Rand e Nynaeve vão até Shadar Logoth protegidos por Asha'man e Aes Sedai, e enquanto estes lidam com alguns dos seguidores d"O Escuro - não consegui manter uma contabilidade de quantos e quais, pra ser honesto; como eu disse, o final é uma correria - eles limpam Saidin da maldição da loucura que afetava a fonte masculina do Um Poder. No processo, Shadar Logoth é destruída, assim como a estatueta que permitia que uma mulher acessasse a Choedan Kal - os sa'angrial gigantes que acumulam enormidades de poder. Vai ser interessante ver como isso vai ser desenvolvido nos próximos livros, particularmente considerando os Asha'man! Veremos como a coisa anda!

quinta-feira, 22 de março de 2018

Ressentimentos

Sou um homem com 40 anos, solteiro, sem filhos, branco, hétero com uma carreira motivada pelo coração e que não traz retorno financeiro suficiente pra eu viver decentemente - eu sobrevivo, no máximo, mas viver, mesmo, dentro do que o sistema de consumo contemporâneo tem como definição, é uma palavra que não se aplica à minha vida. 
Minha vida não tem fontes de emoção. Eu não tenho causas pra lutar, minha geração é conhecida por ser preguiçosa, cínica e ressentida - e eu sou um estereótipo da minha geração. Acho que não sou tão cínico quanto gostaria, mas os anos tem me ensinado bastante. Na verdade, eu sou bem egoísta. Eu não me importo. O sofrimento dos outros me afeta pouco, a menos que sejam pessoas muito próximas. Não que eu seja completamente insensível. De fato, eu sempre tomei cuidado pra comprar em comércios locais, ao invés de usar supermercados, produzir a menor quantidade de lixo possível, doar roupas e calçados que não vou usar... O mínimo de alguém com consciência social. Mas recentemente descobri que esse mínimo está bem longe do que é considerado "fazer o bem". Eu me senti mal por algum tempo, por conta disso, mas eventualmente concluí que, considerando que eu já não consigo nem sequer ter uma qualidade de vida razoável, não tenho como abraçar as dores do resto do mundo. Eu faço o que posso, por mínimo que seja, e espero que as pessoas que tem mais energia, recursos ou amor no coração façam mais do que o mínimo. Provavelmente isso me classifica como uma pessoa má. Que seja.
Em termos de trabalho, não tenho visão, talento ou ânimo suficiente pra crescer. Sequer fui capaz de terminar a faculdade de artes, depois de 12 longos anos tentando - e falhando em compreender questões básicas, como agradar professores ou dizer o que eles queriam ouvir (ah, o ressentimento...). Por outro lado sou indolente demais pra pensar seriamente em mudar de área de atuação. Honestamente, não sou bom em nada, tenho criatividade quase nula, sou lento pra aprender e uma memória abismal não ajuda em nada. A cada ano que passa me ressinto mais de não ter conseguido entrar no exército e ter ficado por lá, como um bom soldado - se tem uma coisa que eu sei fazer é seguir ordens. Teria dado um excelente operário de fábrica, acho, mas eu tinha que gostar de desenhar... Gostaria de me tornar ferreiro, mas quem diabos precisa de um ferreiro hoje em dia? Enfim. Essa parte da minha vida definitivamente já está definida: Serei uma pessoa que sobrevive, aos trancos e barrancos, até o dia da minha morte.
Nunca tive filhos, porque nunca achei uma mulher que quisesse dividir essa alegria comigo e sempre fui responsável demais pra colocar uma criança no mundo sem querer. Até disso hoje em dia me ressinto. Não tenho alguém que precise de zelo e cuidado, alguém por quem eu precise me esforçar pra ser melhor e fazer mais. Não sou um modelo à ser seguido, não tenho alguém pra quem ensinar nada, não tenho uma pessoa pra ver crescendo e se desenvolvendo, aprendendo e errando no caminho. Sempre desejei ser o pai que eu nunca tive, sempre achei que teria sido bom nisso. Acho que teria me tornado uma pessoa melhor. Mais ativa. Mais interessada. Nunca vou saber.
Nunca consegui desenvolver um relacionamento saudável com alguém. Dei espaço demais, sufoquei demais, não falei o que deveria, falei o que não devia, não me fiz entender, não entendi coisas óbvias... Cometi todos os erros clássicos pra acabar com relacionamentos, exceto a boa e velha traição - e disso eu definitivamente não me ressinto, só pra variar. Não tenho alguém por quem olhar, não tenho alguém que olhe por mim. Não tenho uma pessoa pra dormir ao meu lado, ou pra quem levar café da manhã na cama, nem pra pensar comigo como resolver os problemas da vida, quando eles vierem, ou mesmo apresentar problemas (porque sabemos que eles aparecem), tomar um vinho pra agradecer um dia bom, pensar na escolha dos filhos, chorar perdas, e enfim, viver todos esses pequenos poemas do dia-a-dia que eu sempre quis. Ainda que eu mantenha boas relações com quase todas aquelas mulheres com quem namorei - algumas delas eu até mesmo considero minhas amigas - eu me ressinto da falta de persistência delas. Me ressinto por não me sentir compreendido. E me ressinto, principalmente, por me ressentir, porque isso sempre me faz perceber o quão imaturo eu sou com relação aos meus sentimentos. Eu me apaixono, me entrego e tento como se fosse um adolescente retardado, todas as vezes. E todas as vezes, os fins são como pequenas mortes. Acreditem, não é divertido chegar aos 40 anos e todos os fins de relacionamentos serem tão problemáticos quanto o primeiro. Na verdade, não é nada divertido chegar aos 40 e todos os relacionamentos parecerem enigmas tão complexos quanto o primeiro...
Eu passei a minha vida toda - pelo menos a parte da minha vida que eu lembro - na mesma casa. Transformei a terra ao meu redor em uma parte de mim, ao longo dos anos. Aprendi a gostar da terra, a entender a terra, a adorar a terra, tudo nesse lugar. Aqui cantei, fiz fogueiras, bebi, fumei, transei, conversei, celebrei casamentos, ri, chorei. Corri pelado na chuva, enterrei animais que amava ou que escolheram essa terra como seu local de morte. Aqui fiz serenatas de amor (que pareceram de horror, mas o que vale é a intenção), duelei com espadas de espuma e metal, arremessei machados, atirei com arcos e bestas, aprendi a cozinhar, desenhar e trabalhar com madeira. Aqui me tornei um bruxo e experimentei fórmulas e rituais mágicos, as vezes acompanhado, mas quase sempre solitário. Aqui eu chorei noites de solidão, uivei de tristeza, ri histericamente de alegria, fiz juras de amor, recebi juras de amor. Aqui tentei me matar (sem sucesso, obviamente) e descobri o peso da palavra solidão. E o quanto é libertador saber que se é amado. Essa casa, que nunca foi realmente minha, e parte de mim, e eu tinha grandes planos pra ela. Queria que se tornasse um lugar onde as pessoas pudessem vir pra se libertar do mundo lá fora. Que viessem não só pra conversar, tomar café, fazer churrasco ou jogar RPG - mas que ainda viessem fazer tudo isso! - mas pra se sentirem incluídas em alguma coisa. Eu queria que as pessoas se sentissem abraçadas sempre que entrassem aqui. Eu tinha grandes planos pra esse lugar. Mas nunca tive autonomia. Nunca tive dinheiro. E sim, me ressinto profundamente disso.
Agora esse sonho vai se juntar àqueles outros. De ter sido militar. De ter um filho. De casar. Vai praquele lugar onde os sonhos mortos se juntam e uma vez ou outra, se dão as mãos e dançam até que eu chore sozinho no escuro.
Em breve as Gaylands vão ser só mais uma casa no Sítio São Marcos, e eu vou ser só mais um quarentão em crise em algum outro lugar. Me entristece saber que nunca vou por um filho no colo e contar sobre como foi o casamento que celebramos ali, no toco onde eu acendo velas as vezes, ou de como uma vez jogamos futebol dentro do galpão - e nem estávamos bêbados! - ou daquela vez que expulsei um assaltante de dentro de casa usando uma espada!
E eu queria muito ter alguma coisa positiva pra terminar esse texto, mas não tenho. Nesse momento sou uma pessoa triste, amargurada e ressentida, e pela primeira vez na minha vida, sou incapaz de assumir o espírito da Poliana e achar um lado positivo disso tudo.
Enfim. A roda do ano gira, e talvez um dia eu olhe pra esse momento com menos tristeza. Nesse momento, isso simplesmente não é possível. 
Áqueles que estiverem lendo isso, um pedido: sei que é muito fácil ser agressivo ou fazer graça com os sentimentos alheios - eu sei bem disso, porque já me expus bem mais do que deveria na rede. Mas eu realmente não estou exatamente com estrutura pra aguentar extremismos, ok? Juntem-se a mim na minha tristeza, sejam positivos, sejam negativos, não digama nada, mas por favor, não ataquem ou diminuam o que eu estou sentindo. Aceitem que algumas pessoas são mais emotivas que outras, e se vocês acharem isso engraçado ou irrelevante, levem suas opiniões pra longe daqui, pelo menos dessa vez. Grato.

quarta-feira, 7 de março de 2018

The Path of Daggers

Muito bem, The Path of Daggers será um divisor de águas nas resenhas da série The Wheel of Time, de Robert Jordan. Eu evitei ao máximo revelações sobre a trama até aqui, mas um dos objetivos principais do Café com Letra sempre foi servir de ajuda pra minha memória tenebrosa. Recentemente, durante a "leitura" de Winters Heart, o décimo livro da série,  tenho achado difícil me localizar nos eventos que já ocorreram na história quando eles são mencionados - e, na verdade, graças à essa minha resistência à fazer revelações sobre a trama, as "resenhas" anteriores dos livros da série tiveram muito pouco de resenha...

Então farei aqui uma pequena recapitulação dos eventos dos nove livros da série que ouvi até aqui. Portanto, estejam avisados:

*** REVELAÇÕES SOBRE A TRAMA ADIANTE ***


New Spring, o primeiro livro da série, foca em Moiraine Damodred e Siuan Sanche, duas Aes Sedai que entram em contato com a profecia do renascimento do Dragão e iniciam uma jornada para encontrar, proteger e guiar o Dragão Renascido para que ele possa cumprir seu papel na profecia. 

20 anos depois, em The Eye of the World, Moraine finalmente encontra o Dragão Renascido, Rand Al'Thor e junto com ele, Mat Cauthon, Perrin Aybara, Egwene al'Vere e Nynaeve al'Meara eles fogem de um exército de Trollocs e acabam na cidade abandonada de Shadar Logoth, onde Mat é infectado pelo malevolente Mashadar através de uma adaga amaldiçoada. Eventualmente o grupo chega ao Olho do Mundo, a única fonte de Saidin que ainda não caiu sob influência d'O Escuro, onde eles confrontam Aginor, Balthamael e Ba'alzamon, três dos seguidores d"O Escuro. Os primeiros dois são destruídos e o terceiro é derrotado, ao custo da destruição do Olho. durante a batalha, eles são capazes de recuperar o brasão de Lews Therin Telamon e o Chifre de Valere.

Em seguida, nos eventos narrados em The Great Hunt, O Chifre de Valere e a Adaga de Shadar Logoth são roubadas por seguidores d"O Escuro, e o grupo parte atrás dos itens, chegando, eventualmente, à cidade portuária de Toman Head, que está sob controle Seanchan, uma nação longínqua que iniciou uma campanha de dominação. Pegos entre os exércitos de Seanchan e os Filhos da Luz (uma organização militar-religiosa dedicada à destruir os seguidores d"O Escuro), Mat acaba soando o Chifre, ressuscitando um exército de antigos heróis que derrotam os Seanchan. Durante a batalha, Rand confronta novamente Ba'alzamon, derrotando-o mais uma vez mas sendo ferido no processo.

No livro seguinte, The Dragon Reborn, a líder das Aes Sedai, Siuan Sanche, envia Nynaeve, Egwene e Elayne À caça do Ajah Negro, um grupo de Aes Sedai que secretamente seguem O Escuro, enquanto Mat descobre uma conspiração para assassinar Elayne e Moiraine, Lan Mandragoran, Loial e Perrin seguem Rand, que secretamente decidiu ir em peregrinação até Tear para se provar como Dragão Renascido.  O livro culmina com o grupo se reunindo em Tear, onde Moraine derrota Be'lal e Rand adquire Callandor, e com ela derrota Ishamael, possído por Ba'alzemon.

Em seguida, em Shadow Rising, Rand usa Callandor para destruir um exército de Trollocs enviado para atacar Tear, e em seguida parte para o Deserto Aeil acompanhado por Egwene, Mat e Moiraine. Rand, Mat e Moiraine entram em Rhuidean, atrás de respostas. Rand descobre a origem dos Aeil e é marcado com tatuagens de dragões cobrindo seus braços; Mat passa a conseguir acessar memórias de seus ancestrais, e recebe uma lança e um medalhão mágicos; e Moiraine recebe visões sobre o futuro. Eventualmente Rand enfrenta Asmodean e destroi a ligação dele com O Escuro, mantendo-o vivo para que Asmodean o ensine à usar o o Um Poder. Enquanto isso Perrin enfrenta um exército de Trollocs em Dois Rios, e na Torre Branca Siuan é deposta do cargo e seu acesso ao Um Poder é bloqueado. Ela é resgatada por Min e Logain, o Falso Dragão.

Em Fires of Heaven, Mat e Rand enfrentam e dispersam os Shaido Aeil, e depois, acreditando que Morgase Trakand, regente de Andor fora morta por Rahvin, Rand ataca Caemlyn e destrói Rahvin, tomando a cidade sob sua proteção. No combate, no entanto, Moiraine acaba morrendo ao enfrentar Lanfear.

Em Lord of Chaos, Mazrin jura lealdade à Rand e começa a treinar Asha'man na Torre Negra, enquanto um grupo de Aes Sedai rebeldes se reunem contra Elara, a usurpadora da Torre Branca. Essas Aes Sedai rebeldes enviam Nynaeve, Elara e Mat para recuperar o Caldeirão dos Ventos, um artefato capaz de quebrar o controle d"O Escuro sobre as mudanças climáticas, e enquanto isso Rand é sequestrado e torturado pela Torre Branca, mas Perrin eventualmente o salva, e as Aes Sedai que sobrevivem ao combate juram fidelidade ao Dragão Renascido.

Em A Crown of Swords, enquanto Rand e Min tentam debelar uma rebelião de nobres em Cairhien, Padan Fain fere Rand com a Adaga de Shadar Logoth. Depois de se recuperar, Rand e os Asha'man atráem Sammael para Shadar Logoth, onde Rand e seus homens derrotam o vilão.

Finalmente chegamos aos eventos de The Path of Daggers. Elayne, Nynaeve e Aviendha conseguem quebrar a influência d"O Escuro usando o Caldeirão dos Ventos e Rand luta para repelir as forças Seanchans de invadir Altara. Ele perde o controle de Callindor, e a batalha termina em um impasse. Perrin é enviado para deter Masema, o "Profeta do Dragão", e, sem saber, acaba resgatando a rainha Morgase no processo, enquanto as Aes Sedai rebeldes se praparam para fazer um cerco à Torre Branca. Faile Bashere é sequestrada pelos Shado Aeil, e Dashiva, um Asha'man renegado tenta matar Rand, sem sucesso.

*** FIM DAS REVELAÇÕES SOBRE A TRAMA ***

Em uma nota pessoal, como eu achei complexo traduzir os termos do livro pra português. Alguns termos como Forsaken, eu simplesmente suprimi - apesar deles serem os maiores antagonistas dos livros - por não achar uma tradução eficiente. The Dark One traduzido como O Escuro me soou meio ambíguo, mas nesse caso, funciona, porque além de ser uma entidade de fato, ele é uma espécie de "força mágica corruptora".

É interessante perceber também que Mat é deixado totalmente de fora deste livro. O mesmo aconteceu com Perrin em The Fires of Heaven, e, apesar de estar presente em The Dragon Reborn, Rand não teve nenhum capítulo visto de sua perspectiva naquele livro, e os eventos ali foram todos contados por personagens que estavam revolvendo ao redor das ações do Dragão Renascido. É interessante perceber a ausência de um desses três personagens, já que, apesar do grande protagonista da série ser Rand, Mat e Perrin são, certamente, muito próximos de serem considerados protagonistas também.

Enfim! Depois dessa resenha, veremos como serão as próximas. Provavelmente vou fazer revelações sobre a trama no final de todas elas daqui pra diante, pra ajudar a minha memória - e pra poder chamar a resenha de resenha!

Sigo achando a série excelente, e continuo sugerindo fortemente a leitura! 

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Sozinho

Nos últimos anos eu tenho pensado muito em um assunto em particular: Solidão.

Passei a maior parte da minha vida sozinho. Não essa solidão cercada de gente que muitos falam, esse isolamento do mundo que as pessoas sentem mesmo quando estão num ônibus lotado ou andando pelos centros abarrotados de gente das cidades grandes. Não, eu me refiro à solidão de fato. Imagino que isso seja bastante comum entre desenhistas - e artistas em geral - já que o desempenho da nossa atividade é naturalmente solitária. É muito difícil desenhar enquanto há distrações por perto, como pessoas, por exemplo, tirando nossa atenção do objeto de trabalho. De fato, graças à isso, eu imagino, eu acabei desenvolvendo hábitos noturnos: à noite, as chances de ser interrompido por chamadas telefônicas, visitas, pedidos de ajuda com trabalhos domésticos ou - em tempos mais recentes - mensagens eletrônicas, cai drasticamente. Se eu preciso de horas (literalmente) pra conseguir me concentrar o suficiente pra trabalhar sem essas interrupções, imagina com elas. Além disso, mesmo quando consigo me concentrar no trabalho, uma interrupção no meio do processo de desenhar geralmente manda todo o foco pro espaço, e o resultado final do trabalho geralmente não fica muito bom - de fato, eu consigo separar desenhos meus que foram feitos com e sem interrupções pela quantidade de detalhes neles.

Além disso, tendo morado em uma casa afastada da civilização, com vizinhos tão interessados em ficar sozinhos em suas próprias casas quanto eu ajuda bastante no que diz respeito à não encontrar pessoas.

Finalmente, meu círculo de amizades minguou consideravelmente nos últimos anos. As pessoas se mudaram para locais longínquos, se tornaram adultos responsáveis com milhões de coisas para fazer e tarefas que têm que ser concluídas, e graças à isso meus hábitos sociais simplesmente definharam. Até uns anos atrás, eu saia consistentemente todas as semanas para passar um ou dois dias com amigos seja jogando RPG, bebendo ou simplesmente jogando conversa fora. E, de maneira semelhante, eu recebia visitas duas ou três vezes por semana, com os mesmos intuitos sociais listados acima.

Diabos, 10 anos atrás não passava um único dia em que eu não encontrava com um conhecido pra tomar um café, fumar um cigarro, jogar uma partida de algum RPG bizarro ou mesmo pular e gritar ao redor de uma fogueira!

E é engraçado pensar que eu ainda não estou na idade de ficar contando os meus amigos que morreram. Oh, sim, já perdi alguns deles, mas foram bem poucos. A maioria dessas pessoas que eu visitava, ou que me visitavam, estão absolutamente vivas, saudáveis e constituindo família. Só que em outros lugares. Elas estão na Alemanha, em Portugal, nos Estados Unidos, em São Paulo, Florianópolis, Porto Alegre, São Lourenço do Sul e, alguns, tão perto quanto Pelotas. Mas mesmo estes, ao alcance de uma visita de ônibus ou mesmo uma pedalada, estão, via de regra, muito ocupados com seus trabalhos, filhos, esposas, maridos e empresas, ou muito cansados por sua jornada semanal de trabalho ou ainda se encontrando com pessoas mais próximas, com quem o contato é mais simples e não requer um elaborado planejamento pra que seja possível uma visita.

E não, eu não acho que nenhuma dessas pessoas, por qualquer motivo que seja, traiu minha amizade ou que sejam amigos ingratos. De forma alguma. A vida anda, as coisas mudam. "A natureza da vida é mudar, tovarish", dizia um um russo conhecido meu. As pessoas se afastam porque a vida faz com que elas se afastem, e é só isso. É natural ao nosso modo de vida contemporâneo e não há nada de errado com isso. De fato, eu admito que fico feliz por essas pessoas, que foram tão longe pra alcançar o que consideravam o melhor pra si, e saíram da cidade ou do estado ou mesmo do país ou do continente pra ter uma vida melhor. Fico feliz quando um amigo me diz que está se mudando, ou que vai ter um filho, mesmo sabendo que isso certamente fará com que eu o veja com muito, muito menos frequência.

Mas, independente de ficar feliz ou não com essas pessoas, o fato imutável é que eu não consegui me adaptar tão bem à vida. Me isolei demais, me afastei demais, protelei demais visitas, consenti demais com a preguiça e com a vontade de ficar sozinho. Tanto que, agora, a solidão é, com certeza, minha companheira mais comum, quer eu queira, quer não.

Ah, sim, eu vejo gente todas as semanas. Afinal, o caminhão da xepa passa aqui na frente todo o sábado, e eu tenho pelo menos cinco minutos de contato direto com outro ser humano. Além disso eu preciso comprar ração pros meus gatos toda sexta, e troco dois dedos de prosa com o meu vizinho que vende ração nesse dia de cada semana. As vezes até temos uma conversa mais longa, enquanto eu concordo que a violência está realmente um absurdo, ou que as pessoas realmente perderam a vergonha na cara nesses últimos anos. E, na verdade, são essas conversas com o Paulo que me fazem, em geral, pensar em solidão. Paulo, sentado no seu galpão de rações, assistindo a globo durante toda a tarde, é a pessoa com quem eu mantenho uma interação mais frequente nos últimos cinco anos. Não que ele não seja um sujeito gente fina. Longe disso. Mas é terrível pensar que a pessoa com quem eu mais tenho conversado ao longo dos últimos cinco anos é alguém que me presta um serviço, e não um amigo.

Em 2016 esse paradigma foi alterado consideravelmente com a inclusão na minha vida de uma pessoa extremamente sociável e com uma família extremamente presente. Uma pessoa que preenchia muito do meu tempo - que de outra forma teria sido passado sozinho. E que, quando se afastou, repentinamente, me deixou em um vácuo de companhia que era ainda mais pesado do que a solidão anterior, justamente por ter me dado o gosto de uma vida preenchida com outra presença. Esse vácuo, essa solidão mais aguda, foi o que me fez pensar na solidão que eu sinto, e que venho sentindo nos últimos anos. E isso me tornou amargurado, aguçou minha melancolia natural, e me deixou no que eu acredito que tenha sido a borda de uma depressão. Por sorte, percebi isso a tempo, e consegui não seguir na direção errada. Entrei em contato com amigos dos velhos tempos, procurei novas pessoas pra conhecer, saí com gente que não conhecia. Algumas dessas coisas foram boas, outras, nem tanto, mas serviram pra eu perceber que ter gente ao meu redor não é só uma coisa que eu preciso pra me manter são: é algo que eu amo. Eu adoro conhecer pessoas. Ver vidas diferentes. Conhecer medos, inseguranças, sonhos, modos de pensar e entender o mundo que sejam diferentes dos meus. Esses últimos quatro meses, em que tenho entrado em contato com gente completamente nova, em que tenho procurado fazer novos contatos, novos amigos, ou me reconectar com pessoas que eu prezo, foram absolutamente fantásticos. Eu tenho tantas pessoas com quem quero conversar, ou voltar a conversar, ou continuar conversando, que meus momentos de solidão são preenchidos com uma antecipação com relação à essas possíveis conversas, ou reflexões sobre as conversas que eu tive nos últimos dias.

Sim, eu quero dividir a minha vida com alguém, e ter meu tempo preenchido com uma cônjuge e eventualmente filhos, mas enquanto isso não acontece, eu gostaria que todas as pessoas que me ofereceram um pouco do seu tempo nos últimos meses, novos e velhos amigos, que vocês fizeram muita diferença na vida desse velho Gay que está digitando toda essa baboseira pseudo-filosófica totalmente sentimentalista. Sou grato a cada um de vocês - eu tentaria colocar cada nome aqui, mas foram muitas pessoas, eu esqueceria de algumas, certamente, e não me perdoaria por isso. Vocês sabem quem são.

E que venham muitas horas de conversas regadas à café, cerveja, chimarrão, restos de churrasco, vinho vencido e docinhos de aniversário!