segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Os Irmãos Corsos

Durante um desses dias sem eletricidade cá no Capão do Leão, graças aos vendavais que acometeram o litoral do estado nesses dias, acabei passando a mão em um livro rápido de ler. Comprei Os Irmãos Corsos em uma recente visita à Rio Grande, em que fui acompanhar uma amiga em sua garimpagens por LPs. Como honestamente não entendo nada de LPs e na ocasião o gosto musical da supracitada amiga me era desconhecido, fui pra parte de literatura do sebo que visitamos, e acabei comprando esse livro, mais pelo nome do autor do que por qualquer outro motivo. 

Admito que não li muitos livros de Alexandre Dumas. Nada além de dois dos Romances de Dartagnan e O Cavaleiro da Casa Vermelha. A prosa não me atraiu muito no caso dos três livros anteriores, e achei que na verdade os livros se arrastam um pouco.

coisa absolutamente não acontece no caso d'Os Irmãos Corsos

Depois de ler este livro, a curiosidade para ler alguns dos outros livros do autor - principalmente Conde de Montecristo e The Wolf Leader e  The Knight of Sainte-Hermine (que acredito não terem tradução por português, infelizmente). 

A história do livro gira em torno de um viajante que entra em contato com uma família da Córsega durante uma visita àquela ilha, constituída por uma viuva e um de seus filhos, cujo gêmeo mora em Paris. Mais tarde, de volta à França, Alexandre, o protagonista, se encontra com o gêmeo De Franchi que foi para o continente, e então, de um conto sobre os costumes e história da ilha que foi berço de Napoleão Bonaparte, o livro toma ares de suspense fantástico, com reviravoltas inesperadas na trama, sem deixar de perder a concisão em momento algum. 

Além de ser uma interessantíssima história sobre os costumes corsos, ainda trás elementos do sobrenatural de modo soberbo. A leitura é rápida, e é impossível largar o livro - li a ora toda em um fim de tarde, sem ser capaz de parar a leitura em momento algum! 

Ainda, o livro tem algumas questões intrigantes: o protagonista têm os mesmo primeiro nome, idade e profissão de Dumas, e a narrativa em primeira pessoa sido escrita pouco após seu retorno à Paris de uma viagem à Córsega, abre especulações de que se trataria de um romance autobiográfico. Obviamente, uma afirmativa muito mais razoável seria dizer que Dumas foi apresentado à uma série de lendas e histórias de fantasmas da Córsega durante sua estada ali, e essa inspiração lhe rendeu um livro que deve ter tido um tempo de fermentação muito breve. 

Definitivamente, uma agradável surpresa que me foi concedida, esse pequeno livrinho! Recomendo absolutamente a sua leitura a todos aqueles que conseguirem colocar as mãos em uma cópia! 

Em tempo: Como não achei a capa da edição que comprei - de 1961... - adicionei essa imagem que veio de uma edição da Abril de 1973, e cujo ilustrador infelizmente não pude precisar. A imagem é definitivamente uma das mais poderosas do livro! 

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Ilusões - as aventuras de um Messias indeciso

Apesar de eu ter certeza que alguns levam esse livro como uma espécie de 'manual prático e filosófico pra vida', ou algo assim, na verdade eu me diverti muito lendo o livro porque, ao ler o trecho introdutório - um manuscrito fazendo uma descrição à moda versículos bíblicos da história do Messias Mecânico - simplesmente me bateu uma de ler o livro como uma espécie de gênese de super herói.

Admito que foi um exercício muitíssimo interessante! Se fosse quadrinizado no estilão Rocketeer - a história se passa na década de 70 e tem aviões, é meio difícil não fazer a associação automaticamente, uma vez que se tem a idéia de gênese super-heroica - tenho certeza que ficaria perfeito como história das horigens de muitos super-heróis! Enquanto lia, me veio a cabeça o (um?) Doutor do Authority, mas certamente também funcionaria pra uma história do Doutor Estranho ou Destino (da DC) apresentando um novo mago ou uma gênese alternativa de um desses universos paralelos.

Mas poxa, afinal do que se trata o livro? Me adiantei nessa história de leitura alternativa e esqueci de falar do livro em si!

Richar Back é um autor que eu gosto. Ele é, eu sei, um autor de livros de filosofia pop ou algo assim. Mas, de qualquer maneira, ainda tenho um certo respeito por algumas de suas obras. Já resenhei aqui duas delas, inclusive: Longe é um Lugar que Não Existe, que tem um lugar especial no meu coração, e Biplano, que me chegou meio sem querer à mais ou menos uns dois anos.  Ainda tenho que conseguir uma cópia de Fernão Capelo Gaivota, sua obra mais famosa.

E lá vou eu me enrolando outra vez sem falar sobre o livro...

Bem, assim como Biplano - e aposto que muitos outros livros de Bach, que é aviador desde os 17 anos - temos um livro que narra as aventuras de um piloto de avião independente (o piloto, não o avião). Nesse caso, porém, nosso protagonista se encontra com um sujeito singular, um Messias que desistiu do cargo. É uma história interessante sobre como as coisas podem acontecer quando um Messias vêm à terra. É fantástico, meio filosófico, tem momentos até engraçados e é bem simples de digerir. Um livro fácil com uma história direta e, se não enlevante, ao menos interessante.

Finalizo com a passagem final da introdução do livro, que dá uma idéia boa do que o livro traz:


26. E ele lhes falou: “Se um homem dissesse a Deus que o que queria mais que tudo era auxiliar o mundo sofredor, fosse qual fosse o preço para si, e Deus lhe respondesse o que devia fazer, o homem deveria fazer o que lhe era ordenado?”

27. “Pois claro, Mestre!” exclamaram. “Devia ser para ele um prazer sofrer as torturas do próprio inferno se Deus lha pedisse!”

28. “Não importa quais fossem essas torturas, nem a dificuldade da tarefa?”

29. “Seria uma honra ser enforcado, uma glória ser pregado a uma árvore e queimado, se fosse isso que Deus pedisse”, disseram eles.

30. “E o que fariam vocês, perguntou o Mestre à multidão, se Deus lhes falasse diretamente, em pessoa, e dissesse: ‘ORDENO QUE SEJAS FELIZ NO MUNDO, ENQUANTO VIVERES.’ O que fariam então?”

31. E a multidão calou-se e nem uma voz ou som foi ouvido sobre os morros e pelos vales.

32. E o Mestre disse: “No caminho de nossa felicidade encontraremos o conhecimento para o qual escolhemos esta vida. É assim que aprendi hoje e prefiro deixa-los agora para seguirem o seu caminho.”

33. E seguiu o seu caminho no meio da multidão e voltou ao mundo dos homens e dos motores.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Estatuto do Homem


ESTATUTO DO HOMEM
(Ato Institucional Permanente)
                                       
 
    Artigo I
 
   Fica decretado que agora vale a verdade.
   agora vale a vida,
   e de mãos dadas,
   marcharemos todos pela vida verdadeira.
 
 
   Artigo II
   Fica decretado que todos os dias da semana,
   inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
   têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
 
 
   Artigo III
 
   Fica decretado que, a partir deste instante,
   haverá girassóis em todas as janelas,
   que os girassóis terão direito
   a abrir-se dentro da sombra;
   e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
   abertas para o verde onde cresce a esperança.
 
 
   Artigo IV
 
   Fica decretado que o homem
   não precisará nunca mais
   duvidar do homem.
   Que o homem confiará no homem
   como a palmeira confia no vento,
   como o vento confia no ar,
   como o ar confia no campo azul do céu.

 
           Parágrafo único:
 
           O homem, confiará no homem
           como um menino confia em outro menino.
 
 
   Artigo V
 
   Fica decretado que os homens
   estão livres do jugo da mentira.
   Nunca mais será preciso usar
   a couraça do silêncio
   nem a armadura de palavras.
   O homem se sentará à mesa
   com seu olhar limpo
   porque a verdade passará a ser servida
   antes da sobremesa.
 
 
   Artigo VI
 
   Fica estabelecida, durante dez séculos,
   a prática sonhada pelo profeta Isaías,
   e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
   e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
 
 
   Artigo VII

   Por decreto irrevogável fica estabelecido
   o reinado permanente da justiça e da claridade,
   e a alegria será uma bandeira generosa
   para sempre desfraldada na alma do povo.
 
 
   Artigo VIII
 
   Fica decretado que a maior dor
   sempre foi e será sempre
   não poder dar-se amor a quem se ama
   e saber que é a água
   que dá à planta o milagre da flor.
 
 
   Artigo IX

   Fica permitido que o pão de cada dia
   tenha no homem o sinal de seu suor.
   Mas que sobretudo tenha
   sempre o quente sabor da ternura.
 
 
   Artigo X

   Fica permitido a qualquer pessoa,
   qualquer hora da vida,
   o uso do traje branco.
 
 
   Artigo XI
 
   Fica decretado, por definição,
   que o homem é um animal que ama
   e que por isso é belo,
   muito mais belo que a estrela da manhã.
 
 
   Artigo XII
 
   Decreta-se que nada será obrigado
   nem proibido,
   tudo será permitido,
   inclusive brincar com os rinocerontes
   e caminhar pelas tardes
   com uma imensa begônia na lapela.

 
           Parágrafo único:
 
           Só uma coisa fica proibida:
           amar sem amor.
 
 
   Artigo XIII
 
   Fica decretado que o dinheiro
   não poderá nunca mais comprar
   o sol das manhãs vindouras.
   Expulso do grande baú do medo,
   o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
   para defender o direito de cantar
   e a festa do dia que chegou.
 
 
   Artigo Final.
 
   Fica proibido o uso da palavra liberdade,
   a qual será suprimida dos dicionários
   e do pântano enganoso das bocas.
   A partir deste instante
   a liberdade será algo vivo e transparente
   como um fogo ou um rio,
   e a sua morada será sempre
   o coração do homem.


  Thiago de Mello
Santiago do Chile, abril de 1964