segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A Terra Tem Espaço

Esse é mais um pequeno livro de contos de Asimov, que como sempre, explica um pouco do porque do bom doutor ser um dos grandes mestres da ficção científica. 

O livro tem 15 contos, que falam dos mais diversos assuntos. Passado Morto, o primeiro conto, é uma clássica história de viagem no tempo que lida com questões políticas e sociais de maneira absolutamente brilhante - e não, não é tedioso como geralmente acontece com histórias que lidam com esses assuntos (afinal, tem viagem no tempo envolvida!). 

A Cela de Bronze é um interessante conto que figura um demônio e um aspirante à cria do inferno às voltas com uma prisão de quatro dimensões. Simples e eficiente. 

Sonhar pe um Assunto Particular, que fecha o livro, é uma história sobre sonhos e visões empresariais muito bem delineado. Um conto que explica muito bem porque ainda existem escritores, desenhistas, artistas e sonhadores no mundo - e porque eles sempre existirão. 

Mas, definitivamente, a minha história favorita do livro é O Bardo Imortal, que nas entrelinhas fala, basicamente, que o que nos sabemos sobre a história da arte em todas as suas formas não passa de mera especulação pretensiosa. Me lembrou muito um texto que li no facebook sobre arte que era mais ou menos assim: "daí o professor ensina que o artista usou azul ali porque ele queria passar o sentimento de tristeza e solidão. E se fossem quatro horas da manhã, o vermelho tivesse acabado e o cara simplesmente quisesse terminar logo o quadro?" 

Em tempo: Há muitas citações sobre o Multivac nesse livro - o multivac é o "computador definitivo" que aparece em muitas outras histórias do bom doutor, incluindo A Última Pergunta. Sugiro dar uma olhada nessa história antes de cair em A Terra tem Espaço, além de lembrar que a maioria dessas histórias foram escritas na década de 50, o que significa que computadores impessoais, gigantescos e funcionando a cartão eram, realmente, o mais provável futuro da computação. 

E, é claro, não posso deixar de dizer que o livro é todo muito bom, apesar de eu ter falado só de quatro contos aqui. Vale cada linha. Leitura fortemente recomendada! 

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Fernão Capelo Gaivota

Já escrevi algumas resenhas de livros de Richard Bach aqui no Café com Letra, e um de seus livros inclusive figura na minha lista de livros que eu mais recomendo a leitura, pra todo mundo.

Fernão Capelo Gaivota é, possivelmente, um dos livros mais famosos de Bach. Foi escrito na década de 70, e é bom manter isso em mente durante a leitura. Porque? Bom, vamos por partes.

Primeiro, essa é a história de uma gaivota, como provavelmente fica evidente no título - eu, particularmente, não tinha certeza. Uma gaivota estranha, que gosta de voar, mais do que de comer, e que na verdade é extremamente fissurada na 'arte de voar mais e melhor'. Na verdade, resumidamente, é a história sobre obsessão.

Mas também é uma história - provavelmente a primeira de muitas histórias de Bach sobre o assunto - sobre um messias. Fernão acaba se tornando uma espécie de 'avatar das gaivotas voadoras' u algo assim. Ele encontra outros desajustados como ele, ensina-os a fazer as bizarrices que ele mesmo faz e assim ajuda a espalhar a idéia de que gaivotas deveriam se preocupar mais com voar e menos com comer. Eu já mencionei que é uma história sobre obsessão?

Fernão é tão bom em praticar sua obsessiva busca pela perfeição do vôo que, eventualmente acaba sendo contactada por gaivotas celestiais, que o levam para o plano das gaivotas voadoras, ou algo assim. Lá ele encontra outras gaivotas que se dedicaram ao vôo mais do que a comida e que, assim como Fernão morreram de ianiç... Erm... Ascenderam à um plano superior, melhor dizendo, onde trocam experiências de vôo e passam o dia todo praticando. Como eu disse antes, obsessão.

Eventualmente Fernão é enviado de volta à terra das gaivotas mais realistas, digo, menos iluminadas sobre as verdadeiras razões da vida, com a missão de procurar aquelas que como ele e seus amigos possuem uma obsessão em comum na arte do vôo. É, obsessão é a palavra chave aqui também.

Sim, é um livro sobre procurar a perfeição, sobre amar o próximo e não deixar ninguém pra trás. De um ponto de vista. Eu particularmente li uma história sobre uma gaivota obsessiva que quer fazer as outras perceberem como ele está certo e não é um completo desajustado - afinal, existe um plano superior com gaivotas celestiais que existem somente pra praticar o vôo, então como ele poderia estar errado?

Mas, como eu disse lá no começo, esse livro é do começo da década de 70. Época do paz e amor, em que as pessoas tinham muitas dúvidas e poucas certezas, e messias eram interessantes. Hoje, porém, e um livro prosaico que fala sobre - adivinhem? - uma gaivota e sua obsessão por voar.

Certamente meu livro preterido de Bach até o momento. Na verdade, foi o primeiro livro dele que eu tenho que admitir que não gostei. Na minha humilde opinião, é um livro de auto-ajuda antes da auto-ajuda ter ganhado uma sessão só pra sí nas livrarias, nada mais, nada menos.

domingo, 8 de fevereiro de 2015

O Centauro no Jardim

Apesar de já ter ouvido falar bastante de Moacyr Scliar (particularmente depois da polêmica envolvendo Max e os Felinos e As Aventuras de Pi) esse foi o primeiro livro dele que li. É difícil pra mim resistir à um livro cujo título tem uma criatura mitológica - apesar de eu achar, antes de ler o livro, que pudesse ser apenas algum tipo de alegoria, o que me fez demorar tanto para finalmente pegar a obra.

O tal centauro não é uma alegoria, no fim das contas - ou talvez seja; falo disso mais adiante, na parte em que há revelações sobre a trama.

A história segue a  narrativa de Guedali, um centauro nascido em uma família do interior do Rio Grande do Sul, mais especificamente na cidade de Quatro Irmãos. Guedali nos conta em primeira pessoa as aventuras e desventuras que passou até seu 38º aniversário, narrando ele próprio a história na forma de memória. Há uma boa dose de situações inusitadas - como é de se esperar quando estamos falando de um centauro em pleno século 20 - uma carga considerável de conteúdo sexual e vários personagens interessante -incluindo, vejam só, outras criaturas míticas!

A narrativa é rápida e ágil, bem de acordo com o que se espera de uma narrativa de memória. Infelizmente em muitos pontos há uma frustrante falta de detalhes, e algumas situações são completamente inverossímeis - mesmo quando envolvem um centauro.


***REVELAÇÕES SOBRE A TRAMA ADIANTE***

Admito que a bem-sucedida cirurgia que transforma nosso protagonista e sua esposa em humanos mais ou menos normais - e sua metamorfose subsequente em pessoas absolutamente comuns, no aspecto fisiológico - me deixou bastante frustrado. Além de considerar o procedimento absolutamente forçado - tanto quanto seria separar dois irmãos siameses que compartilham o mesmo corpo  da cintura para baixo, por exemplo - tornou a narrativa mais centrada na aceitação de duas pessoas "diferentes", apesar de normais, na sociedade. Depois da viagem para o Marrocos, onde acontece a cirurgia, o livro vira uma comédia da vida privada, sem grandes atrativos, exceto pelo capítulo onde Guevali encontra a Esfinge, talvez.

Além disso o capítulo final deixa evidente que ser um centauro provavelmente era, simplesmente, uma fantasia da mente de Guedali, o que torna o livro, apesar de interessante pelo aspecto  da ambiguidade, permitindo que o leitor 'escolha' o que lhe parece mais interessante (se Guedali era ou não um centauro no final das contas) muito menos um livro de fantasia e mais um livro sobre um homeme com uma fantasia. Esse capítulo final, na minha opinião, torna a obra em si muito menos interessante, dando uma 'versão mastigada' de uma possível reflexão que o leitor poderia fazer por sí só no final da leitura.

*** FIM DAS REVELAÇÕES SOBRE A TRAMA ***


Como uma nota de leitor chato no livro há referências à 'centaura' como a contraparte feminina de um centauro, o que é incorreto. Centauríade seria a expressão correta. Mas como a maioria das pessoas provavelmente não sabe disso, é absolutamente aceitável do uso 'incorreto' do termo - mas que centauríade ainda é muito mais interessante do que centaura, ah, isso é!

O Centauro no Jardim é um livro interessante, mas, definitivamente, não é meu tipo de leitura. Dificilmente vou voltar à Moacyr Scliar no futuro, mesmo que ele escreva outras obras que figurem criaturas fantásticas no título.