domingo, 9 de maio de 2010

Biplano


O primeiro livro que eu lembro de ter lido na vida chama-se "longe é um lugar que não existe". Eu não recordo qual o tema central da história, apenas que o protagonista está indo ao encontro de alguém, mas ele vai atravez das asas dos pássaros, não "em pessoa". Na verdade, eu recordo muito mais as imagens em sépia do livro, frescas na minha memória há mais de 20 anos, do que da história em sí. E, claro, lembro da mensagem que o título carrega literalmente.

A maioria das pessoas, porém, vai conhecer Richard Bach - o autor de Longe é um lugar que não existe - por outro livro seu: Fernão Capelo Gaivota. Se não leu, pelo menos já ouviu falar, muito provavelmente.
Richard Bach é aviador desde os 17 anos - o sujeito nasceu em 1936, o que significa que tem sido um aviador por um looongo tempo. E a maior parte de seus livros falam sobre a experiência de voar, ou têm suas histórias intimanente ligadas à esta habilidade, seja o vôo imaginário nas asas de um pássaro, seja um vôo na cabine de um aeroplano, seja o flutuar do espírito fora do corpo.

Assim, quando peguei "Biplano" para ler, e ví o nome de Bach, sabia que obviamente o avião que aparecia na capa do livro não era só uma metáfora ou um simples motivo para a história. Eu sabia que o livro tinha à ver com aquele biplano, e que ele seria o personagem principal da trama. Eu estava certo até certo ponto.

A história é basicamente a narração de uma viagem de costa à costa dos EUA, feita por um piloto que acaba de trocar seu monomotor de cabine fechada por um biplano da década de 30. Apesar de uma ocasional chuva, tempestade de vento e mesmo um pequeno desafio no final da trama, a coisa toda é basicamente um relato de viagem, extremamente solitária, repleta de lembranças e pequenas peculiaridades.

O resumo da história é este, sem tirar nem por.

Mas Bach é um escritor excelente, além de um piloto experiente, e faz com que este relato de viagem se torne muito, muito mais do que simples relato.

Se torna uma experiência de vôo.

Ler Biplano é como voar de avião, mesmo para aqueles que, como eu, jamais voaram em um. Bach nos faz ver a viagem, nos faz ir com ele dentro da cabine, e entre muitos dados técnicos e termos próprios da aviação que somos incapazes de conseguir realmente entender, estamos voando por sobre um país que não conhecemos, mas que somos capazes de ver, de sentir completamente. Nós somos sacudidos por rajadas de vento, contamos as batidas dos pistões enquanto o motor à nossa frente trabalha e despeja óleo na viseira do capacete, percebemos que não nos molhamos na chuva graças à velocidade do aeroplano, sentimos os pés pesados quando finalmente aterrisamos mais uma vez... Sonhamos e lembramos lembranças e sonhos que não são nossos, mas que bem poderiam ser, num vôo que não estamos fazendo, mas poderiamos estar.

Biplano é uma viagem maravilhosa à bordo da imaginação e das lembranças de Richard Bach, bem como um livro que ensina a calma da solidão e que pede uma reflexão sobre o que fazemos de nós mesmos, comos chegamos até este ponto e até aonde - e em que velocidade - queremos chegar.

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