sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Atlantis

"Um dos maiores mistérios da história finalmente revelado" bem em cima na capa, foi a frase que fez com que eu torcesse o nariz pra esse livro quando vi pela primeira vez. Obviamente, era uma mentira, e o livro era, obviamente, um romance. Mas o objetivo dessa frasezinha no topo da capa era pegar aqueles leitores incautos que não sabem dessas pequenas coisas óbvias.

Quando o livro circulou aqui em casa pela primeira vez, ano passado, trazido pela minha avó para minha mãe, eu não quis chegar nem perto. Tinha certeza que era alguma coisa como um livro do Dan Brown misturado com uma daquelas teorias malucas do tipo Eram os deuses Astronautas do Erich von Däniken. Olhei pra capa muito bem produzida - com relevos, metalizados e um trabalho obviamene profissional de um designer - e pensei "esse livro tem uma capa muito boa pra ter um interior que preste."

Mas eis que a vida dá voltas e no final do mês passado fui ajudar minha avó numas reformas na casa dela. Despreparado, levei só um livro de contos - Coisas Frágeis, do Neil Gaiman, que vai ser o conteúdo da minha próxima resenha, em alguns dias - já lido até a metade. Erro terrível quando se vai ficar em uma casa onde a biblioteca fica no quarto de uma senhora de oitenta e poucos anos de sono leve... Aconteceu que, na primeira noite que passei lá, tive uma crise de insônia , coisa bem normal pra mim. Sem um computador, e não querendo "gastar" o livro do Gaiman, que não ia durar uma hora naquela noite insône, acabei pegando o Atlantis, que tinha visto mais cedo na sala da casa, bem longe do quarto da minha caríssima avó e sua biblioteca.

E obviamente, o livro foi uma decepção.

Jack, ou Jhon - não lembro mais o nome do insosso protagonista - é basicamente uma mistura de Indiana Jones com Batman. Na casa dos quarenta anos, ele já foi tudo. Tem dois mestrados no MIT, foi Marine, é arqueólogo em uma fundação fictícia com recursos infinitos e nunca perde o controle. Consegue dirigir escafandros semelhantes à armadura do Homem de Ferro com um tiro no abdomem sem sentir dor, nunca erra um tiro, sempre tem um plano genial na manga, é uma enciclopédia militar ambulante além de ter conhecimentos infalíveis sobre culturas antigas da pré-história até o período Helenístico.

O vilão, por outro lado, é uma paródia ambulante de tudo o que há de ruim: um terrorista árabe com dinheiro infinito, que apesar de ter um império do mal é impulsivo e manipulável, gordo ao ponto de precisar de ajuda para se mover, e com bafo de carne podre - sim, tudo isso é dito sobre ele ao longo do livro.

Ambos são colocados em lados opostos na disputa pelos tesouros da Atlântida depois que, surpreendentemente, três descobertas no espaço de dois dias, feitas por três arqueólogos, surpreendentemente amigos de longa data, são feitas ao redor do globo, dão pistas sobre a localização da Alântida. No espaço de uma semana, eles fazem suas descobertas, decifram textos, triangulam suas informações, encontram a Atlântida, encontram um submarino soviético atômico desaparecido desde a guerra fria, defendem ambos os achados do vilão, desmantelam sua rede de terrorismo e, claro, não vão ao banheiro nem uma vez! Magnífico!

Eles fazem tudo isso munidos de tecnologia futurista - apesar do livro se passar na contemporaneidade - e nunca erram em uma tradução de línguas mortas desconhecidas (que são feitas como se fossem a segunda língua de cada um) ou quando levantam teorias pungentes a cada quatro páginas do livro, sem nunca titubear por sequer um segundo. Graças à isso, eles descobrem o que realmente estava escrito nas tabuas dos Dez Mandamentos, desvendam o mistério da Arca de Noé, encontram o elo de ligação de todas as culturas européias, e, claro, encontram Atlântida e desvendam todos os seus mistérios.

Já disse que fizeram isso em sete dias?

Pois é. Tudo baseado em achados arqueológicos inventados, tecnologias que não existem, e em gênios multi-tarefas que são verdadeiras forças da natureza.

Um dos livros mais chatos que li em anos!

O único ponto interessante do livro é que o autor adiciona um apêndice no final do livro dizendo quais teorias e achados são verdadeiros e quais são falsos - só um é verdadeiro, e nunca foi explicado - e fornecendo muitas informações interessantes sobre locais citados no livro, que oferecem um monte de material pra pesquisas.

Fora o apêndice, eu sugiro que qualquer um que não esteja com uma severa crise de insônia e sem nenhuma outra alternativa de leitura se mantenha bem longe desse livro. Sério.

Não digam que eu não avisei.

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