quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A Sombra do Vento


“Numa ocasião ouvi um cliente habitual comentar na livraria do meu pai que poucas coisas marcam tanto um leitor como o primeiro livro que realmente abre caminho até ao seu coração. Aquelas primeiras imagens, o eco dessas palavras que julgamos ter deixado para trás, acompanham-nos toda a vida e esculpem um palácio na nossa memória ao qual, mais tarde ou mais cedo – não importa quantos livros leiamos, quantos mundos descubramos, tudo quanto aprendamos ou esqueçamos-, vamos regressar.”


A primeira vista esse parece um livro sobre perdas. Mas no fim, descobrimos que esse é um livro sobre encontros e sobre certezas. Me encontrei nesse livro de muitas formas, muitas vezes, com alegria e tristeza, em cada momento distinto. 

A narrativa de Zafrón alterna entre prosa ora poética, ora irônica. O enredo mistura gêneros como o romance de aventuras, novela gótica e até mesmo os folhetins amorosos de Victor Hugo. Ambientado na Barcelona franquista, mas com ecos no início do século XX,  a Sombra do Vento é um desses livros que simplesmente se tornam impossíveis de largar assim que se inicia a leitura. Mais do que uma história apenas, é uma homenagem ao poder dos livros de contagiar o leitor, e da própria magia contar histórias. 

Com ambientes e personagens fantásticos, incríveis (no sentido literal da palavra) mas ainda assim absolutamente palpáveis. É uma mistura absolutamente improvável de imaginação e realidade, que cria um ambiente difícil de aceitar, mas ainda assim concreto. 

sim, é um livro bastante difícil de descrever... 

A história em si tem de tudo: mistério, morte, polícia, perseguição, sexo, amizade e política. E apesar dessa mistura absolutamente abrangente de situações, é um livro conciso, que não se perde em momento algum. Talvez seja a prosa rebuscada de Zafrón que produza esse efeito, criando todo um ar de pompa burlesca na narrativa - tornando o que poderia ser, na mão de um escritor menos prolixo, uma história medíocre em um grande obra. Mas o caso é que, além disso, a história é extremamente intrincada, com várias camadas à serem descobertas. Com personagens mentindo e enganando, num enredo que já não é simples, o que pode tornar um leitor mais desatento em um náufrago dentro da história. 

Eu sempre digo que pra mim, o conteúdo é muito mais importante do que a forma. Que a história, em si, é muito mais importante do que a prosa do escritor. E esse é um livro com uma grande história, que acontece de ter uma prosa absolutamente impecável! 

Vou me alongar em mais elogios se continuar a escrever, e creio que já deixei clara minha admiração pelo excelente trabalho que Carlos Ruiz Zafrón fez nesse livro. 

"- Mas Domênico, tu não falou nada sobre a história do livro!"

Pois é. Não falei, mesmo... 

Bom, é sobre livros. Tem um protagonista adolescente, que se apaixona, como todos os adolescentes, e faz grandes burradas, como todo adolescente. E ele tem amigos, como alguns adolescentes, e tem dessabores, como quase todo adolescente. E tem ídolos, como acontece com certos adolescentes. Só que no caso de Daniel Sempere, essas paixões, erros, amizades, desafetos e ídolos estão em um nível épico, em um momento e lugar que não comporta épicos. 

"- Mas Domênico, isso foi extremamente vago..."

Sim, eu sei. Leia o livro. 
*pisca o olho*

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