domingo, 10 de novembro de 2024

She: A History of Adventure


    She, ou nas versões traduzidas para o português, Ela, a Feiticeira, é um livro de aventura do autor Sir Henry Rider Haggard publicado em 1887. 

    Sir Henry Rider Haggard (ou H. Rider Haggard, como assinava seus livros) publicou 50 livro ao longo de sua vida, tendo outros 5 publicados post morten. Foi um pioneiro no gênero litrerário Mundo Perdido, e sua obra mais conhecida, várias vezes adaptada para cinema de uma ou outra forma é As Minas do Rei Salomão. 

    Eu já tinha ouvido falar nas Minas do Rei Salomão - assisti pelo menos três adaptações em filme - mas honestamente, nunca ftive muito interesse em procurar o livro original. 'She', no entanto, era uma obra que eu desconhecia completamente até recentemente, quando encontrei na rede uma imagem de personagens de ficção heróica d final dos século 10 e começo do século 20. A imagem tinha vários personagens que eu reconhecia (e que, graças à minha péssima meória, eu não lembro mais quem eram, com exceção do Tarzan), com uma única exceção: Uma mulher pálida, em um vestido e véus brancos, anotada na imagem como "Ayesha". Fui pesquisar sobre ela, descobri o livro e subsequentemente encontrei a versão em audio na Librivox. Apesar da obra completa estar à disposição no site - assim como inúmeros outros - eu admito que é um pouco complexo de ouvir pela troca constante de narradores entre os capitulos, incluindo alguns narradores que não falantes nativos do inglês, o que em parte atrapalha a imersão e, por outro lado, soa engraçado em algumas partes, o que reduzo impacto da narrativa tensa, principalmente nos capítulos finais. 

    'She' é uma narrativa moldura escrita em forma epistolar: a história da viagem de Horace Holly e Leo Vincey à Africa para desvendar um mistério do passado de Leo é manuscrita por Holly, e o calhamaço então é entregue para um editor inglês, quando o par de aventureiros reotrnam à sua terra natal. O editor nos conta como conheceu rapidamente os protagonista e então, alguns anos mais tarde, recebeu o manuscrito que agora está sendo puvlicado em forma de livro.

O "Ostraco de Amenartas,
criado pela irmã de Haggard, Agnes Barber,
usado para produzir fac-símiles
que ilustravam algumas versões do livro.
 

    O enredo do livro segue Horace Holly, um jovem professor da Universidade de Cambridge, que recebe de Vincey, seu melhor amigo, a tarefa de criar seu filho, Leo. Ele dá a Holly uma espécie de cofre, com instruções de que ela não deve ser aberta até o aniversário de 25 anos de Leo. Quando a caixa é aberta, eles descobrem o antigo "Óstraco de Amenartas" - um fragmento de cerâmica com inscrições em grego, - além de uma tradução para o latim do Ostraco, com instruções e informações extras, aparentemente recolhidas pelos ancestrais de Leo. O conjunto cria um enigma relativo à origem de Leo e um mistério envolvendo uma antiga sacerdotisa egipcias. Seguindo as instruções encontradas no cofre, Holly, Leo e seu servo, Job, viajam para o leste da África.

    'She' é uma obra fortemente estabelecido em ideais neoimperialistas, enaltecendo os princípios da cultura inglesa e retratando os nativos africanos com uma cultura selvagem - em contraste com a erudita e esclarecida Ayesha, de origem Árabe, que apresenta ponderações filosóficas sobre religião e política e desdenha dos ingleses que consideram seus feitos como "bruxaria"

    De fato, uma das coisas que eu estranho na escoha da tradução para o português da obra, é o fato de Ayesha mas de uma vez repreender Holly quando este presenciava algum feito "milagroso" derivado dos seus conhecimentos chamando-os de feitiçaria ou magia. Ela sempre se identifica como uma mulher da ciência, que passou literalmente séculos aprimorando seus conhecimentos, desdenhando até mesmo de noções de religião como mera crendice e superstição sem fundamento. 

A obra também toca em alguns assuntos referentes à sexualidade, apresentando uma cultura matriarcal entre os Amahagger (a tribo que reverencia Ayesha e no meio dos quais os protaginstas estão inseridos durante a maior parte da história) e retrata Ayesha como uma mulher irresistível e totalmente ciente disso, que utiliza este atributo para subjugar e dominar facilmente tanto Holly (um misógino contumaz) quanto Leo (determinado a rejeitar Ayesha por seus atos relacionados à uma nativa).

    Eu admito que, apesar de ser apresentada como a antagonista da história, Ayesha é a personagem com pela qual eu senti a maior empatia. Ela tem objetivos claros, uma visão de mundo esclarecida e conhece perfeitamente suas capacidades. Enquanto isso, Holly tem sérios problemas em lidar com sua aparência - ele é feio ao ponto de ser apelidado de "babuíno" pelos Amahagger - sendo extremamente autoreferente e um tanto preconceituoso. Leo, embora seja retratado como o perfeito cavalheiro inglês, passa uma certa infantilidade e empáfia de quem sempre teve tudo o que quis, e embora tenha tido acesso à toda a cultura acessível em seu tempo, é bastante imaturo e pouco perspicaz. 

Mas isso pode ser preconceito de um leitor inserido no paradigma do século 21, lendo uma obra com quase 140 anos de idade. 

Enfim! 

Há mais três livros com Ayesha como personagem, publicados por Haggard, incluindo um encontro com Allan Quartermain, e eu estou bastante inclinado a procurar esses livros noa Librivox pra ler todo que ele escreveu sobre a personagem - e provavelmente vou ler As Minas do Rei Salomão e os outros livros do Allan Quarterman. 

Gostei bastante da escrita de Haggard, e achei as idéias e a trama do livro excelentes! 

Leitura fortemente recomendada! 

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Série Infinity's End

 Ano passado eu ouvi e resenhei os três primeiros livros da série Infinity's End, Caspian's Gambit, Caspian's Fortune (em uma única resenha) e Tempest Rising. A série foi escrita por Eric Warren e a versão que eu ouvi da série foi narrada por Larry Gorman - que faz um excelente trabalho, alias! 

Eu honestamente achei que estava mantendo a série resenhada "em dia" a medida que fui terminando cada livro, então foi uma considerável surpresa chegar aqui e descobrir que só tinha resenhado os primeiros dois volumes e o conto introdutório! 

Não vou resenhar cada um dos livros separadamente, porque minha memória não é boa o suficiente pra separar a trama de cada um individualmente - em teoria, é pra isso que eu mantenho esse maldito blog... - então vou resumir minha experiência aqui dos volumes 3 à 9 da série: Darkest Reach, Journey's Edge, Secrets Past, Planetfall, Broken Links, Memory's Blade e Infinity's End.

A série toda está no canal do autor, no youtube, e acredito que foi colocada lá por ele mesmo, considerando os comentários nos vídeos, o fato deles estarem lá há 2 anos sem repercussões e com uma considerável quantidade de comentários, reações e visualizações. 

Não que Eric Warren seja um grande autor - ele sequer tem uma entrada na wikipedia, o que diz muito sobre seu reconhecimento - e eu duvido muito que alguém teria se dado ao trabalho de piratear o trabalho do sujeito. 

O comentário acima provavelmente deixa claro o que eu achei da série... 

Como eu disse nos primeiros dois volumes, Eric Warren não traz nada de novo nos seus livros. É um space opera bem básico, com muitos alienígenas (interessantes e diversos, de fato, mas nada particularmente inovador) e uma trama de ameaça galáctica, na forma de uma espécie invasora que aparentemente tem capacidades de distorção temporal, oferecendo uma ameaça considerável à Coalisão (a Federação de Star Trek com um nome um pouco diferente). 

O protagonista da série é Caspian Robeaux, que no primeiro livro é um ex-membro da Coalisão que foi exonerado graças à um incidente à alguns anos. Sem dinheiro, trabalhando pra vigaristas pra conseguir consertar uma nave velha e tendo como unico aliado um velho robô com um senso de humor questionável. Ele recebe, eventualmente, a proposta pra um serviço pra Coalisão que pode limpar o seu nome - porque, obviamente, ele não cometeu nenhum erro realmente, e só foi incriminado injustamente. 

Nos livros subsequentes - e aqui obviamente haverão releelações sobre a trama! - ele se torna um membro relutante da Tempest (cuja tripulação não confia nele, porque, afinal, ele é um criminoso) na tentativa de contactar os Sil, uma espécie alienígena que não faz parte da Coalisão, tendo uma tecnologia muito mais desenvolvida, e que pode ajudar com a ameaça que vem do outro lado da galáxia. 

Acontece que o tal incidente que fez Robeaux ser expulso da Coalisão foi justamente um ataque à uma nave Sil usando uma tecnologia experimental. De maneira bastante forçada, eles conseguem contatar os Sil, e até garantem um emissário da espécie pra ajudar com a tal ameaça intergaláctica. 

No processo, no entanto, eles enfrentam um monstro interdimensional que quase consome a nave, e uma parte da tripullação (incluindo o capitão) morre no processo. Entre as pessoas, o interesse romantico de Robeaux. 

E é a partir daqui que a trama vai pro espaço (trocadilho obbviamente intencional). 

Além de um permanente estado de insegurança por parte de Robeaux, que de alguma forma ainda consegue ter apoio de alguns membros da tripulação da Tempest, mesmo sendo um bêbado inútil com passado criminoso. A tripulação usa tecnologia Sil em conjunto com tecnologia experimental pra melhorar a eficiência da Tempest (o correspondente à construir um carro de fórmula 1 a partir de um fusca, em uma semana, estando dentro du fusca no processo) o que permite que eles vão de encontro com a ameaça galãctica (sozinhos, porque eles são a única nave da Coalisão que tem potência de um carro de fórmula 1...) comandados pela primeira oficial da nave. 

Eles acabam apanhando feio para os Athru (a espécie que vem de fora da galáxia com sua tecnologia de deslocamento temporal), caem em um planeta temporalmente embriagado, descobrem que a primeira oficial é meio Athru, uma descoberta que custa a vida de alguns tripulantes (incluindo a namorada da primeira oficial) porque a personalidade Athru recém desperta é dominante - mas logo em seguida é subjugada, porque ela só era necessária pra haver esse ataque psicótico da primeira oficial. Como a primeira oficial não é mais confiável, Robeaux (que agora todos sabem que foi injustamente acusado do incidente com os Sil anos atrás) se torna o novo capitão, eles conseguem sair do planeta deslocado no tempo pra descobrir que se passarma 50 anos na Tempest - que estava em órbita - e que agora toda a galáxia está dominada pelos Athru. 

Finalmente eles divisam um plano pra contactar os Sil (apesar da emissária ser considerada uma traidora por... Motivos) que se aliaram aos Athru mas não gostam deles, e graças à mãe da primeira oficial (que é uma Athru; a mãe, não a primeira oficial, que é só meio-athru) eles bolam uma estratégia totalmente descabida de atacar a ameaça de dentro, com uma única nave, que apesar de ser uma relíquia do passado (à essas alturas o equivalente à um Modelo T nas ruas de hoje) AINDA é mais eficiente do que todas as outras neves singulares. 

Nota: Eu sei que a Tempest ser a nave mais pica das galáxias vem do fato dela ter tecnologia Sil combinada com tecnologia da Coalisão em conjunto com uma tecnologia experimental, que seria o equivalente à ter uma bomba atômica durante a primeira guerra, mas seria um tanque, com uma bomba atômica, contra toda a europa, que no momento está aliada à Asia... Sei lá, pra mim não fez o menor sentido... 

Enfim! 

Eles descobrem que os Athru são uma "versão evoluída" dos humanos, que passaram tipo 3 milões de anos em um planeta fora de sincronia com o resto da realidade, e que o planeta terra não é o planeta natal dos humanos, que na verdade são o resquício de uma raça que morreu milênios atrás, só que antes mandou "naves arca" com humanos criogênizados pelo espaço. Uma dessas naves chegou na "terra" onde uma outra raça alienígena ajudou eles a terraformar o planeta, o que levou à formação da coalisão, enquanto os Athru estavam evoluindo à moda louco na galáxia ao lado. Então os Athru - com milhões de anos de tecnologia na frente, e sem nenhuma semelhança com um humanos - decidiram que os humanos deveriam ser eliminados porque eles eram uma mancha na pureza genética da raça, uma espécie de ancestral defeituoso que ainda andava por aí. 

Eles vão lá, explodem tudo, a mãe da primeira oficial morre, Robeaux é considerado um herói, os 100 humanos que sobraram decidem reerguer a Coalisão (que, honestamente, era uma organização pra lá de problemática), Box (o robô com senso de humor questionável, lembra? eu mencionei ele lá no começo) vira chefe da enfermaria da Tempest, fim. 

Tem um ou dois outros personagens relevantes que eu deixei de fora - como a emissária dos Sil - de propósito, porque o texto já tá mais longo do que essa série vale... 

O fato é que a construção de cenário tem vááários problemas. Além do final scooby-doo, que deixa tudo ainda mais bizonho; os Athru estavam todos concentrados ao redor de um único planeta, esperando uma bomba atômica explodir eles, e não tinham nenhum tipo de decentralização de comando: o Palpatine (porque eles tinham um Grande Lorde Negro do Mal, obviamente) era o único que mandava na espécie toda, e quando ele morreu ninguém mais achou que valia a pena exterminar os humanos, que eram vistos, até agora, como moralmente falhos e inclinados à genocídios - o que foi provado quando eles eliminaram uma parte considerável dos Athru. Mas não, sem o Palpatine, o resto dos Athru, muito mais avançados tecnologicamente que todas as outras espécies por aí vão simplesmente ir embora, boa sorte, apaga a luz o último que sair. 

Tá certo. 

Daí tem os robôs. O Box é o melhor piloto, o melhor médico, o melhor engenheiro e o melhor combatente da tripulação da Tempest, sem competição. E ele é um modelo antigo de robô, desenvolvido pra carga. Mas, estranhamente, não tem nenhum outro robô na Tempest - ou em qualquer lugar na história. Considerando as capacidades de um robô, porque não ter um contingente deles em cada nave, se pra mais nada, pra trabalhos perigosos como explorar planetas desconhecidos ou trabalho pesado? Em Star Trek, os androides não existem por razões sociais largamente explicadas dentro do cenario, e o Data é basicamente uma entidade singular. Em Star Wars, droides são empregados pra uma enorme variedade de trabalhos, mas tem a personalidade apagada de tempos em tempos pra não causarem problema. Agora, em Infinity's End, não tem nada disso. Box nunca é considerado um objeto, mas sim um indivíduo, todo mundo sabe que robôs existem por aí, mas por algum motivo todo mundo decide, sem razão nenhuma, que robôs são "desnecessários". 

E a primeira oficial usa a porra de uma katana! Uma katana, caralho! 

Bom, como eu disse, eu tive problemas com a série. Particularmente o último livro, que parece apressado, tem várias reviravoltas completamente estapafúrdias, uma quantidade de Deus ex Machina que eu não esperava e esplicações costuradas com macarrão cozido demais. Eu tinha remado um pouco pra terminar o livro oito, e a choradeira constante da primeira oficial e do Robeaux me cansaram eventualmente, mas o final da série é o que acabou com a série pra mim. 

Provavelmente não lerei - ou ouvirei, enfim - nada do Eric Warren no futuro, e, obviamente, não recomendo a série; mesmo estando à disposição no youtube de forma totalmente gratuita, é só perda de tempo. 

Enfim, pode ser que tenha gente que, como eu, tenha tempo pra perder. Vai saber... 

sábado, 20 de maio de 2023

Tempest Rising


 Segundo livro da série Infinity's End, do autor Eric Warren, que eu decidi ouvir depois de ter encontrado meio que sem quereo o primeiro volume da série em um canal que, eu assumo, é mantido pelo próprio autor no youtube

Assi como no caso do primeiro livro - e do conto introdutório da série - que eu ouvi inicialmente, não há nada de novo na trama pra qualquer leitor de ficção científica. Temos um cenário nos moldes de Star Wars (só que sem magos espaciais) em que várias espécies alienígenas organizadas em grupos com motivações distintas, com uma trama centrada em um personagem ladino (nos melhores moldes de Han Solo) que precisa contactar uma espécie isolacionista para salvar a galáxia de uma ameaça sinistra. 

Com um robô com aspirações humanas, um anti-herói em quem ninguém confia mas que na verdade é uma pessoa "boa de coração" e algumas tramas políticas rasas, é uma combinação de vários elementos de séries de ficção científica num caldo consistente - mas tão pouco memorável quanto qualquer bom sopão que alguém já comeu na vida. 

A narração de Larry Gorman é excelente, e o livro não é longo o suficiente para se tornar chato e tem alguns momentos interessantes - apesar de, definitivamente, ficar devendo para o primeiro volume da série em praticamente todos os requisitos. 

Um bom "audio para fazer alguma outra coisa ouvindo". Devo ouvir os outros audiobooks da série, já que estão facilmente disponíveis no youtube. Em geral, boa "leitura". 

terça-feira, 18 de abril de 2023

Caspian's Gambit & Caspian's Fortune


Caspian's Fortune é, oficiamente, o primeiro volume da série Infinity's End, do autor Eric Warren. Caspian's Gambit é um prelúdio para a série, e eu assumo que foi lançado em algum momento em que a série já estava em andamento - eu não consegui encontrar entradas nem para a série em si nem para o autor na wikipedia pra confirmar datas e lançamentos, o que, alias, pareceu bastante estranho, considerando que ele tem, aparentemente, mais de 20 livros lançados, alguns deles na lista de best sellers. 

A série em si tem 9 volumes (além do prelúdio) pelo que consegui levantar, e eles vão aumentando de tamanho a cada livro, como de praxe em séries literarias. Encontrei uma lista com todos os volumes até o nono em um canal dedicado ao autor no youtube

Trupiquei nesses livros meio sem querer no youtube, não sei bem como, e nunca tinha ouvido falar no autor ou nos livros antes. Mas como estava ouvindo um audiobook em duas partes e a segunda parte foi removida do youtube antes de eu poder ouvir (não ter grana pra manter um audible é uma coisa triste na minha vida.... Mas um dia eu reativo minha conta lá!) tive que encontrar uma substituição, e Caspian's Fortune estava na minha lista de "assistir depois". Como era o único audibook lá, fui dar uma olhada e como a conta era relativamente antiga e com vários livros uploadeados há algum tempo, achei que era uma aposta mais ou menos segura. 

Os livros não são um obra-prima da ficção científica. Não trazem conceitos revolucionários nem roteiros originais. Aliens, naves, lasers, impérios intergalácticos e armas apocalípticas. Uma história bastante "sessão da tarde" de fato - como os livros de Poul Anderson, que eu leio quando consigo botar as mãos em algum. Mas Eric Warren é um autor competente, com uma escrita fluida e eficiente e seus personagens são bem construídos, interessantes e bem explorados (o piloto de Caspian é um robô viciado em novelas mexicanas, por exemplo). 

Eric Warren não traz nada de novo nesses dois primeiros livros - e duvido que os próximos volumes façam algo diferente - mas o estilo de escrita, a narração extremamente eficiente de Larry Gorman e o refrescante fato de (PEQUENA REVELAÇÃO SOBRE A TRAMA!) não haver romance no enredo definitivamente me fizeram querer continuar acompanhando as aventuras de Caspian pela galáxia. 

Um bom livro (particularmente em sua versão em audio) e um bom conto introdutório. Em geral, uma leitura válida para quem só quer ouvir (ou ler, imagino) uma obra de ficção científica despretensiosa. 

Certamente ouvirei os próximos volumes à seguir - se o youtube não tirar eles do ar antes... 

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Os Gelos de Ganymedes

Mais um livro sessão da tarde do meu autor favorito de desligar o cérebro, Poul Anderson. Esse livreco, no entanto, diferente da maioria dos livros de Anderson, me frustrou bastante, e ao invés de me deixarcom a sensação usual de que "tem idéias interessantes, mas a maioria foi explorada com pouca profundidade" que eu geralmente tenho quando leio os livros do autor, os Gelos de Ganymedes realmente me incomodou com seu desenvolvimento. 

A premissa do livro é interessante - como acontece com quase todas as obras de Anderson: um grupo deterraformadores profissionais é contratado para tornar a vida da colônia humana em Ganimedes (que no livro é escrita com "Y" porque sim), a lua de Júpiter que já foi colonizada há algumas décadas mas que ainda sofre profundamente com as condições climáticas do maior satélite natural do planeta dos anéis. 

Uma idéia extremamente interessante ao longo do livro é o fato de que a Ordem dos Engenheiros Planetários (os tais peritos em terraformação) tem uma postura quase religiosa com relação ao seu trabalho e seu dever com a Ordem em si. Eles colocam em risco suas vidas várias vezes ao longo do livro para proteger seu profissionalismo e o bom nome da Ordem. Não é dado nenhum tipo de explicação sobre o assunto de forma mais explícita, e se por um lado pode ser simplesmente o fato de estarmos diante dos mais leais funcionários de uma empresa jamais vistos ao longo da história da literatura, parece que há uma certa compulsão que faz com que os homens e mulheres que trabalham para a Abadia (o nome dado ao escritório central da Ordem, na lua) protejam, à todo custo, sua profissão. 

Mas, como tudo no trabalho de Anderson, isso não é realmente explorado ou explicado. 

Enfim, de volta à trama em si: 

O que acontece é que em Ganimedes, esses primeiros colonos la instalados na imaginativamente cidade batizada de "X" desenvolveram uma comunidade que, embora não possua ocnhecimento de engenharia avançado o suficiente para modificar o planeta ao seu redor, possui um conhecimento extremo de genética que permite que eles tenham alterado seus habitantes para suportarem o ambinte hostil do planeta. Esses humanos alterados - em contraste com os <<Cinc>> e os Angels>>, os líderes da comunidade, aparentemente sem alterações - que formam a maior parte da mão de obra da lua tem uma interessante característica secundária devido à sua alteração genética, que é o de serem extremamente afáveis e de baixa inteligência. 

Eu imagino se isso teria sido feito de propósito... 

Enquanto os <<Angels>> são os lideres religiosos e acasata mais alta de Ganimedes, os <<Cinc>> são os líderes civís, subordinados da liderança religiosa e fazendo todo o serviço burocrático de fato, enquanto os humanos alterados são a força de trabalho dos branquelos. 

Ah, alias, eu memcionei que os colonos originais eram um grupo de extremistas religiosos chamada de Doutrina Branca Americana? Então. A colônia é basicamente um antro da Klu Klux Klan no espaço. 

Considerando que os membros da Abadia senviados para o trabalho de verificação inicial são homens e mulheres de diferentes culturas da terra e do resto do sistema solar - tendo um marciano, uma japonesa, um indiano e um europeu que eu lembre agora de cabeça - obviamente que a chegada deles causa um certo rebuliço imediatamente. 

Alias, as descobertas feitas ao longo do livro fazem com que haja uma consideravel tensão entre os dois grupos o tempo todo, com escutas, uso de idiomas diferentes utilizados para a conversação, uma conspiração envolvendo um grupo de cientistas extinto há séculos... Tem algumas coisas bem interessantes que podiam realmente dar uma baita história. 

Mas ao invés disso, Anderson decide se focar em dois dos personagens, perdidos no planeta, sem contato com o resto da ppulação de Ganimedes, criando teorias infundadas e decidindo como salvar a própria pele da situação em que se encontram. Basicamente desconsiderando toda a construção de cenário e se concentrando nesse drama de sobrevivência que, no final, leva literalmente 4 páginas para resolver a situação na Luazinha quando os dois finalmente conseguem voltar pra X e desbancam o governo sem aparentemente dificuldade nehuma... 

Um desperdício do tamanho de um livro de bolso. 

De fato, esse foi, facilmente, o livro mais frustrante de Anderson, que costuma resolver sua trama com pressa e deixa de desenvolver alguns dos assuntos mais interessantes na suas tramas, mas definitivamente nunca nessas proporções. 

Infelizmente, este é o primeiro livro de Poul Anderson que eu não posso recomendar para ninguém. 

segunda-feira, 7 de março de 2022

Fogueira de acampamento

 A região tecnicamente era parte da área de preservação, mas não era mencionada em qualquer guia de turismo ou mesmo no site do parque. Isso era provavelmente devido ao fato de ficar muito longe das trilhas geralmente usadas por visitantes, acessada por uma picada pouco usada que só se mantinha aberta graças ao fato da região ser seca demais pra que a vegetação fosse capaz de reivindicar a trilha quase esquecida. 

A região era erma, sem qualquer atividade humana em um raio de vários quilômetros em qualquer direção, e o ambiente agreste a elevado fazia com que fosse possível ver com clareza todo o ambiente ao redor. Seria um local perfeito para trilhas e acampamentos, se não fosse tão remoto. 

A picada terminava eventualmente em uma pequena plataforma de pedra coberta por cimento já integrada ao ambiente ao redor devido à erosão e que, em algum momento, fora um estacionamento. A posição era pouco mais elevada do que o terreno ao redor, permitindo uma vista fantástica de toda a região até as colinas mais distantes, meio azuladas devido à distância. A área estava praticamente vazia, exceto por uma solitária caminhonete estacionada logo no começo da área de cimento. O furgão verde-abacate se aproximou lentamente, passando pela caminhonete e seguindo até o fim do que ainda sobrava da plataforma de concreto que agora cobria uns 30 metros do terreno, e parou despretensiosamente quase como se estivesse pronta para seguir viagem. Mas seu motor desligou e um silêncio estático se apoderou da paisagem. 

Passados alguns minutos, o homem alto, barbudo e vestido como um guerrilheiro perdido desceu do furgão de fibra de vidro, fazendo o veículo oscilar para o o lado do motorista e de volta à sua posição normal depois que o corpanzil do sujeito aliviou o carro de seu peso considerável. Era um sujeito alto, com um tronco em formato de barril e uma expressão de quem não gosta de qualquer outra pessoa. Carregava um embornal de couro atravessado sobre um dos ombros e uma faca em uma bainha tática amarrada à perna.  Além disso, tinha apenas um chapéu de lona, que colocou sobre a cabeça depois de examinar a região ao redor. Se aproximou da caminhonete estacionada no outro extremo da plataforma de concreto e deu uma olhada de longe. Os pneus estavam vazios e a cor era difícil de perceber debaixo da camada de poeira. Os vidros estavam todos no lugar, e as portas pareciam fechadas. Não parecia um carro roubado ou abandonado, mas certamente estava aqui há muito, muito tempo. 

Aparentemente perdendo o interesse no carro, o homem desceu da área de concreto por uma rampa que, em outros tempos, talvez tivesse sido usada para chegar à alguma trilha, atualmente inexistente, e se pôs à caminhar, em um passo confortável na direção de uma plataforma natural, alguns quilômetros adiante. A medida que os passos faziam os pedriscos no chão estalarem sob suas botas, quebrando o silêncio que imperava, algumas cigarras decidiram que a teatralidade da cena tinha cumprido seu propósito e começaram a cantar com vontade. 

Tinha andado cerca de um quilômetro quando parou com uma careta no rosto. Um cheiro de carniça lhe atingiu subitamente, de modo bastante inesperado. Olhou ao redor, para o céu, à procura de aves carniceiras, mas como antes, não viu sinais de vida. inspecionou a área, e notou um pequeno brilho no chão, alguns metros adiante. Se aproximou e viu o pequeno relógio empoeirado, cujas pulseiras não estavam mais no lugar. Pegou a faca de caça e afastou o pó de cima do vidro. Marca 11:56. O homem deu mais uma olhada ao redor, e perdendo totalmente o interesse no relógio extraviado, seguiu seu caminho. 

A caminhada durou umas poucas horas, e nenhum outro evento chamou a atenção do homem de tronco de barril, que parou algumas vezes apenas para tirar uma garrafa de metal de seu embornal, beber todo o líquido de dentro de forma sedenta enquanto apreciava a paisagem, e acomodar a garrafa junto da outra duzia de garrafas que preenchiam quase totalmente a bolsa e voltar a caminhar. A subida na plataforma natural foi um pouco mais difícil do que ele esperava, e atingiu o topo do plato ofegante. Com as mãos nos joelhos, olhou a região, e percebeu que o topo era quase totalmente plano, como se uma grande divindade ancestral tivesse tirado uma fatia da terra com uma grande faca de manteiga. O sol estava perto do horizonte, e se pretendia produzir algum tipo de acampamento, esse era o momento de começar. Caminhou mais alguns passos na direção do que achou que era o centro do platô, procurando uma boa área para fazer uma fogueira, e sorriu ao ver uma área limpa de arbustos adiante, onde algumas pedras baixas haviam sido organizadas em um semicírculo no centro do qual alguns carvões esquecidos ainda descansavam em uma área de fuligem. Largou o embornal nas proximidades do antigo acampamento e se pôs a catar lenha ao redor. Havia uma profusão de pequenos arbustos secos ao redor, o que tornou a tarefa extremamente fácil e simples, e em cerca de meia hora estava sentado na beira dos carvões velhos organizando uma pequena pirâmide de gravetos, com uma pilha de galhos secos ao lado. Teria fogo suficiente para algumas horas, embora duvidasse que fosse possível manter a fogueira abastecida a noite toda. Mas essa não era a intenção. Os últimos raios de sol estavam se esvaindo no horizonte enquanto o homem ascendia a pequena pilha de galhos no começo de uma fogueira e admirava a paisagem deserta ao redor. A noite estava quieta, com poucos sons de animais, e a noite sem lua permitia uma vista magnífica das estrelas que começavam a pontilhar o céu. 

Sentado à luz da fogueira, o homem-barril abriu o embornal de couro e de dentro dele tirou, de forma metódica, todo o conteúdo, como uma criança abrindo uma caixa de brinquedos. Uma dúzia de pequenas vasilhas de metal, achatadas e com tampa de rosca, que separou em dois grupos distintos, uma contendo cinco e outra sete garrafas. Depois retirou o último conteúdo da bolsa: um embrulho de lona bege atado com cordão cru. Pegou as cinco garrafas separadas e voltou a acondicionar dentro do embornal e, por fim, pegou uma do outro grupo, balançou levemente, abriu e bebeu o líquido de um gole, estalando a língua quando terminou. Rosqueou a tampa e colocou a garrafa junto com as outras no interior do embornal de couro. Finalmente, retirou o chapéu de lona e o depositou sobre as vazilhas vazias de metal. Se concentrou então no embrulho de lona, rompendo o barbante e desembrulhando o conteúdo, que era constituído de um naco considerável de carne defumada. Com um sorriso satisfeito, rolou uma das pedras de perto do fogo e depositou o pedaço de carne sobre ele, que chiou em contato com a pedra quente e rapidamente espalhou o aroma de carne no ar . Se concentrou, então, em fitar as estrelas que agora dominavam o céu sem lua e apreciando o termo "via láctea" com uma satisfação quase infantil. Depois de alguns minutos de contemplação, voltou sua atenção para o pedaço de carne que perfumava o ambiente, e usando sua faca para tirar pedaços apreciáveis, devorou rapidamente a refeição. Quando termionou, rolou a pedra que lhe serviu de fogão improvisado de volta para junto do fogo, adicionando alguns galhos secos logo após isso, fazendo o fogo crepitar. Pegou uma das seis garrafas de fora do embornal e entornou o líquido garganta abaixo. 

Enquanto acondicionava o recipiente vazio dentro da bolsa de couro, ouviu o vento levantar ao longe, num farfalhar de galhos que assoviando entre as pedras antes de atingi-lo. Trouxe consigo uma sensação morna ao invés do frescor usual do vento noturno. Mas a sensação estranha não foi tudo o que trouxe no entanto. Farejando o vento que balançou as labaredas da fogueira, o homem barbudo fez uma careta ao sentir o fedor que sentira mais cedo, perto do relógio extraviado. Quente e podre, como o um animal atropelado na estrada cozinhando no asfalto quente, o cheiro fez com que o naco de carne tentasse sair das entranhas onde descansava e foi apenas com algum esforço que o homem impediu que isso ocorresse. 

A fogueira crepitou com o vento repentino, lançando fagulhas e picumãs no ar, e o homem apreciou o pequeno espetáculo da pequena procissão de luzes alaranjadas que subiam no ar, quase como estrelas se despendendo do firmamento em uma dança espiralada. A medida que o vento foi diminuindo, as centelhas foram se apagando junto com o cheiro pungente que ainda pairava no ar, como uma memória ruim, mas não ao ponto de causar mal estar. Quando as chamas da fogueira se acalmaram, tudo ao redor parecia mais escuro do que antes. Olhando ao redor com desconfiança, o homem tencionou os músculos involuntariamente, percebendo a mudança no ambiente. Lentamente olhou para o céu e percebeu, com preocupada, que não conseguia mais ver nenhuma estrela. 

O mundo parecia agora se resumir à fogueira e as poucas coisas que sua luz tocava. As cinco garrafas de metal que cintilavam refletindo as chamas, o surrado embornal de couro,  a pequena pilha de galhos secos, o circulo de pequenas pedras e o guerrilheiro perdido. Além, o mundo acabava em uma escuridão completa e impenetrável. Onde antes era possível ver os contornos de touceiras ressequidas e a beira do plato elevado banhados na luz das estrelas, não havia mais nada. Não havia mais horizonte, e onde antes morros distantes se destacavam contra o céu noturno pontilhado de estrelas, só havia breu. O mundo acabava além dos cinco metros de luz produzida pela fogueira de acampamento. 

Além da luz das estrelas, o vento parecia ter levado consigo também todos os sons. Além do estralar dos galhos queimando no fogo, era possível ouvir apenas a respiração compassada sob a barba do homem. O farfalhar do vento ao longe havia cessado completamente, e com ele todos os pequenos animais que, até então, cantavam algo tímidos, suas melodias noturnas. E no ambiente ainda pairava o fedor como se algo tivesse morrido nas proximidades.

Foi então que o homem ouviu o pigarro. 

O homem segurou o fôlego instantaneamente. Não estava sozinho no platô. Os pelos de seus braços se eriçaram, e ele lentamente virou a cabeça na direção do som e viu um pequeno reflexo na escuridão. Depois outro. Alguma coisa estava logo além do alcance da claridade da fogueira. Observando. Os dois reflexos estavam à pouco mais de um metro do chão, e eram a única coisa visível na escuridão além da fogueira de acampamento. 

- Vai embora - disse o homem com uma voz alta e clara - não tenho mais nada aqui. Enquanto falava, o homem se levantou e, sem tirar os olhos dos dois reflexos na escuridão, puxou com o pé a pedra-forno de perto do fogo, e chutou na dos pontos brilhantes. A pedra rolou pela terra seca, sendo consumida pela escuridão. Os olhos se abaixaram alguns centímetros, como se a coisa tivesse abaixado a cabeça. O homem se moveu lentamente ao redor do fogo, tentando deixar a fogueira entre ele e os reflexos na escuridão, mas eles se moveram com ele. O homem parou e fitou os olhos percebendo que, embora seus próprios passos fizessem considerável barulho esmigalhando os pedriscos no chão, a coisa além do fogo não produzira som algum ao se mover.

Lentamente, o homem se abaixou e pegou uma das pedras que circulavam o fogo. Era um calhau quase grande demais para ser segurado pela enorme mão do homenzarrão, que ele arremessou como uma bocha na direção dos reflexos na escuridão. Embora fosse difícil julgar a distância devido à escuridão, a pedra foi certeira entre os dois pontos brilhantes. Mas não acertou nada além do chão, e rolou para longe. Os olhos se moveram de um lado para o outro lentamente depois que o som da pedra rolante despareceu. Fosse o que fosse, não estava com medo.  O homem então lentamente tirou a faca da bainha a ergueu lentamente, estudando a direção onde o reflexo da chama na lâmina polida ia, direcionando para onde a coisa além da luz da chama estava. Os olhos se abaixaram, num movimento de compressão, como o de um felino se preparando para saltar, e o homem parou o movimento da lâmina. 

- Vai embora! - gritou. 

Um som gutural, como alguém gorgolejando com algo viscoso veio da direção dos olhos. O homem, por sua vez, cerrou os dentes e arregalou os olhos que agora cintilavam à luz do fogo. 

- Então vem, sevandijas mentecapto! Pula aqui e tenta a sorte! VEM! - Berrou a plenos pulmões, e deu um passo na direção da coisa. 

Mas os reflexos na escuridão não estavam mais lá. O homem olhou ao redor, mudando de posição, virando de uma lado para o outro, tentando encontrar alguma pista de onde seu oponente poderia ter ido. Lentamente, sem conseguir encontrar nada ao redor, foi se acalmando. A tensão nos músculos diminuiu, os braços descansaram. Passou a mão no cabelo e percebeu que, embora a noite estivesse fria, suava. Secou a mão nas calças, mas continuou olhando ao redor, com o semblante ainda tenso, a faca ainda firme na mão. 

Uma coisa arremeteu da escuridão, e o atingiu na parte de trás da cabeça. Com um urro, girou sobre o próprio eixo, golpeando o ar com a faca em um movimento amplo. Deu um passo para trás, arfando, dentes serrados. Na escuridão, logo além da luz da fogueira de acampamento, os dois familiares reflexos estavam parados à cerca de um metro do chão. Percebendo algo diferente no ambiente, olhou rapidamente para baixo, e ali, entre ele e os olhos na escuridão repousava um coturno de couro. Se abaixou, lentamente, com a faca alta entre ele e a coisa, e pegou a bota surrada. Se aproximou da fogueira e se permitiu alguns segundos para examinar o calçado. O cadarço não existia mais, e o couro envelhecido estava rasgado e rachado, com manchas escuras em toda a superfície. Depois de um momento de confusão, percebeu que as rachaduras não eram no couro em si, mas sim na camada de substância marrou que cobria o couro. Sangue seco. Em grandes quantidades, velho e abundante. O dono do calçado havia se atolado em sangue - ou a bota havia se banhado no sangue dele. 

O homem suspirou profundamente e jogou a bota na direção dos olhos na escuridão enquanto se abaixava para pegar alguns galhos secos e joga-los no fogo. Depois foi até as cinco vasilhas de metal ainda descansando no chão, pegou uma, desatarraxou a tampa ainda com a faca na mão e bebeu todo o conteúdo. Jogou o recipiente vazio dentro do embornal aberto. 

- Então, o que vai ser? - o homem disse em uma voz desinteressada, voltando a fitar os reflexos na escuridão, que não haviam se movido - Vai ficar aí, esperando que eu fique sem lenha, e me atacar na escuridão, hein? - deu uma risadinha sem vontade - Um predador histrião. 

Voltou o olhar para a fogueira. A coisa na escuridão rosnou seu gargarejo baixo, quando o homem voltou a fitar seus olhos e trocou a faca de mão e sorriu sardonicamente. Com um movimento veloz, se abaixou e pegou um toco pouco mais longo que os outros, que propositadamente havia deixado apenas parcialmente dentro das chamas, e ainda agachado arremessou o archote improvisado na direção da criatura. A chama rosnou no ar enquanto girava no ar, e embora não tenha sido um arremesso perfeito, a chama iluminou a coisa por um segundo antes dela disparar em direção à escuridão. Era imensa. Longo e sinuoso, usou os membros dianteiros para se impulsionar para trás, e depois correu nas quatro patas para longe, numa corrida algo desengonçada. Era escuro, também. Na verdade, o homem percebeu enquanto via a coisa correr para longe, era tão escura que se destacava na escuridão ao redor, permitindo que seus contornos fossem percebidos, ainda que borrados. Tinha uns três ou quatro metros de comprimento, e era muito mais alta nos ombros do que a cabeça fazia acreditar. Os olhos - e de fato os reflexos na escuridão eram olhos - ficavam no centro de uma cabeçorra redonda e disforme, que o homem não conseguiu ver bem, mas lembrava algo simiesco. A cabeça, por sua vez, se ligava ao corpo por um pescoço longo e fino, que se inclinava para baixo enquanto a criatura corria. De pé, com o pescoço ereto, deveria chegar facilmente à cinco metros de altura. 

O homem permaneceu parado, agachado junto ao fogo, enquanto a chama da tocha improvisava se extinguia. Tentava processar o que vira. Pelo comportamento até o momento e considerando a bota ensanguentada, definitivamente não era amistoso. E não gostava de luz. Enquanto se levantava lentamente, ouviu o gargarejo grosso vindo de trás de si, e ficou consciente do fedor apodrecido mais uma vez. Fez uma careta de nojo e voltou a encarar seu adversário. Ficaram ali, se encarando, por algum tempo enquanto a fogueira consumia mais alguns galhos. 

Então, à distância, um cão latiu. Os olhos desapareceram na escuridão, mas o homem ainda conseguia ver o contorno da coisa ali, logo além da luz da fogueira. A cabeça levantada no ar, como se estivesse... Farejando? Repentinamente a coisa correu para o fundo da escuridão deixando o homem solitário no seu pequeno mundo-fogueira. O homem, por sua vez, guardou a faca na bainha e cofiando a barba, olhou ao redor. Espalhou os galhos que havia recolhido com o pé, e suspirou. Não iam durar muito. Se abaixou, pegou mais uma das vasilhas e de um gole, bebeu seu conteúdo. Colocou com as nove outras que jaziam vazias dentro do embornal. Pegou um galho seco e colocou no fogo. à distância, ouviu o cão latir novamente, dessa vez freneticamente. E logo em seguida, ouviu os latidos se tornarem ganidos até repentinamente sessarem por completo. 

Mais uma vez, o único som na escuridão era o estralar dos galhos sendo consumidos pelo fogo. Enquanto se concentrava no silêncio, o homem respirava lenta e ritmicamente, quase sem produzir qualquer som. O que fez com que o som de alguma coisa sendo atirada no chão logo atrás de si soasse alto como uma batida de tambor. Se virou por reflexo, desembainhando a faca e olhando com horror para a pilha de pelos cinzentos e entranhas na expectativa que pulasse sobre ele tentando abocanha-lo. A massa disforme lembrava muito pouco um cão. A mandíbula, a parte da frente do pescoço e as pernas dianteiras não existiam mais. A caixa torácica parecia ter sido espremida para fora, com pontas de costela saindo por debaixo do couro e ao longo do rasgo gelatinoso que havia sido o peito do animal. A cabeça estava revirada para trás, amassada contra as costas do bicho, com os dentes superiores parecendo uma espécie macabra de adorno. O sangue fluía da garganta aberta em um fluxo viscoso, e uma certa quantidade de vapor ainda se desprendia do corpo do animal enquanto os órgãos e entranhas esfriavam. 

- Criatura abjeta - fez uma careta de nojo na direção da coisa na escuridão - cuspiu na direção da criatura, e em seguida chutou o o cadáver do cão em direção à escuridão. A massa de carne não chegou a sair de dentro do círculo de luz produzido pela fogueira. O gorgolejar veio novamente, longo e baixo, e uma... Mão, ou algo similar a uma mão, mas completamente errada (dedos longos demais, com juntas em excesso) lentamente se arrastou para fora da escuridão na ponta de um braço impossivelmente fino e retorcido. Era como se uma tarântula tivesse sido amarrada na extremidade de um galho agora saísse para capturar uma presa, se agarrando lentamente ao redor da cauda do cadáver canino e puxando violentamente a massa de carne disforme para dentro da escuridão. O gorgolejar só sessou depois que o corpo desapareceu no escuro, como se a luminosidade, de alguma forma, ferisse a criatura. Em seguida, uma série de sons de carne sendo rasgada e triturada. 

O Homem sentou ao lado do fogo, jogando mais um galho nas chamas. Não havia muito mais combustível para o fogo. Pegou uma das três vasilhas de metal que ainda estavam fora do embornal, abriu a tampa de rosca e bebeu o conteúdo todo, enquanto fitava a criatura na escuridão. Limpou a boca com o braço, e colocou o recipiente dentro do saco de couro. Olhou para o céu à procura de estrelas, na esperança de ter um ponto de referência. Qualquer ponto de referência. Acima dele, só havia escuridão. Voltou à encarar os olhos logo além da claridade da fogueira. 

Ficaram, assim, encarando um ao outro na escuridão silenciosa por um longo tempo. Cada vez que o homem jogava mais um graveto no fogo, ouvia um pigarro vindo do escuro. Ambos pareciam satisfeitos em apenas aguardar e encarar um ao outro. Eventualmente, no entanto, as piscadas do homem com tronco de barril começaram a ficar mais longas. Estava com uma expressão cansada, olhos encovados e escuras olheiras. Esticou a mão e pegou a penúltima das garrafas ainda fora do embornal.  Colocou no colo e levou a mão, desenroscando a tampa, que caiu no seu colo. Mas a vazilha ficou ali, imóvel. A cabeça do homem pendeu para a frente com a barba se acomodando sobre o peito largo e seus olhos fecharam. 

O homem sacudiu violentamente quando um pigarrear soou atrás de si muito, muito próximo. A fogueira estava apenas em brasas, e quando o homem levou a mão na direção dos galhos secos, viu a mão-tarântula se fechando ao redor dos últimos gravetos e retornar à escuridão, atrás de si, enquanto um fedor quente e podre exalava diretamente atrás de sua nuca. Atingido por um súbito surto de adrenalina, se deitou ao lado da fogueira e começou a soprar as brasas conseguindo apenas um leve brilho avermelhado, suficiente para delinear a cabeçorra da criatura o encarando do outro lado da fogueira. num ângulo bizarro, já que jazia com o rosco encostado no chão. Uma bocarra impossivelmente larga, que parecia dividir a cabeça da criatura ao meio, começo a abrir lentamente, deixando ver os dentes que refletiam o brilho alaranjado das brasas na saliva doentia que os cobria. Seguiu soprando as brasas freneticamente, até que, repentinamente, uma minúscula chama apareceu em meio as brasas da fogueira de acampamento, ao mesmo tempo que o homem sentiu uma quantidade impossível de dedos se fechando sobre seu pulso. 

Com um sorriso maníaco, o homem girou o braço sendo segurado e agarrou agarrou pulso da criatura, formando um emaranhado de dedos em um nó bizarro, enquanto erguia o corpo com o outro braço e jogava o líquido nas brasas agora acesas, que explodiram em chamas, com o líquido inflamável respingando na criatura espalhando as chamas pelo corpo esguio que agora se retorcia em agonia, enquanto a coisa guinchava de dor. Firmemente agarrando a criatura com uma mão, o homem meio tropicando sobre as brasas em chamas sacou a faca e caiu desajeitadamente sobre a coisa em chamas, desferindo golpes alucinados enquanto gargalhava de forma delirante. A coisa flamejante tentava em desespero se arrastar para longe da fogueira de acampamento, agora nada além de uma massa de brasas esparramadas pelo chão, enquanto o homem seguia desferindo golpes incessantemente, alguns certeiros, outros pouco mais do que socos desengonçados. 

- Apedeuta! - um golpe certeiro - Nescio! - um arranhão desengonçado - Avantesma torpe! - uma estocada funda - Parvo! - mais um golpe preciso - Não percebeu... - um soco violento - ...que essa noite... - um corte largo - ...era a presa! - enfiou a faca na garganta da criatura, e sem qualquer equilibrio, caiu por sobre o corpo que fumegava arfava espasmodicamente. O homem ergueu o tronco, montando sobre o peito do monstro enquanto arfava ruidosamente, apoiado no cabo da faca firmemente enterrada no chão através do pescoço macilento. 

Com o fedor de carne queimada misturado ao cheio pungente de podridão que a criatura exalava, o homem ergueu a cabeça na direção do céu e soltou um profundo suspiro. Quando abriu os olhos, a via láctea se espalhava novamente pelo céu, gloriosa. fitou o firmamento sarapintado de estrelas por vários minutos, antes de se voltar para o horizonte e  ver a faixa de azul claro que se formava sobre as montanhas. Ao longe, ouviu cricrilar e zumbido vindo de várias direções, e uma leve brisa afastou um pouco o fedor exalado pela criatura ao mesmo tempo que adicionou alguns sons de farfalhar de arbustos e um eventual assovio entre as curvas das rochas. Assistiu o nascer do sol por detrás das montanhas antes de se levantar. 

Pegou o pedaço de lona que usara para enrolar o pedaço de carne e limpou a faca metodicamente, antes de coloca-la de volta na bainha. Fez o mesmo com a garrafa de metal vazia que jazia ao lado do corpo da criatura - que agora, ao sol, parecia ter encolhido, murchado. Pôs a penúltima garrafa dentro do embornal junto com a peça de lona, sacou o chapéu de dentro da sacola, e depois de atravessar a alça por sobre o ombro, enfiou o chapéu firmemente na cabeça. Pegou então a última garrafa de metal e a examinou contra o sol, por algum tempo. Desatarraxou a tampa e virou o conteúdo no chão. 

- Devil's springs nunca mais! - tampou a garrafa e colocou no embornal - Exceto, talvez, para fazer molotovs... - riu fracamente. Fitou o horizonte mais uma vez, e voltou sua atenção para a criatura que jazia morta. Tinha agora se encolhido em uma posição fetal, e não passada de um metro e meio de comprimento. Cutucou o cadáver com o pé. Parecia duro. Se abaixou e experimentou erguer o corpo. Estava leve e quase não fedia mais. Quase. Colocou a coisa sobre o ombro, como se fosse um tronco, e se começou a caminhar de volta para o furgão. Deu um suspiro quando passou pelos restos mutilados do cão, alguns metros longe dos restos da fogueira. 

Caminhou de volta com mais propósito do que quando chegou, aproveitando o ar revigorante da manhã e sem paradas para beber ou contemplar a paisagem. Alcançou o estacionamento antes do sol estar a pino, mas suava profusamente quando encostou o cadáver ressecado contra a chassi de fibra de vidro (agora não tinha sequer um metro de tamanho no total). Abriu a porta de trás do furgão, jogou o chapéu e o embornal em um dos bancos e de baixo deste retirou uma garrafa plástica de três litros, sem rótulo. Bebeu com sofreguidão, em seguida derramando o resto do líquido sobre o rosto e o corpo. Colocou a garrafa vazia de volta sob o banco, e de lá tirou um grande saco plástico preto, ode enfiou o corpo ressecado, que foi depositado no chão do carro entre os bancos. Fechou a parte de trás do carro, abriu a porta da frente e pegou uma bolsa do lado do passageiro de dentro da qual tirou uma muda de roupas e um par de botas praticamente iguais aos que estava usando - embora estivessem limpas e secas. Se despiu, enfiou suas roupas ensopadas e imundas na sacola, devolveu a mesma para o seu lugar no bando do motorista e vestiu a muda limpa. 

Olhou Uma vez mais para a trilha que havia feito, na direção do platô longínquo. Depois dedicou uma olhada para a caminhonete no outro extremo do estacionamento, decorando a placa. Finalmente, embarcou no furgão, ligou o motor e dirigiu em direção da civilização. Três horas mais tarde, parou em um posto de gasolina em uma rodovia, abasteceu o carro, comeu uma cohinha e bebeu um café. Finalmente, pediu um telefone, e foi encaminhado para um orelhão, de onde ligou para a polícia informando uma placa e a localização de uma caminhonete alguns quilômetros no interior de uma área pouco trafegada de um parque. 

Ninguém nunca verificou a ligação anônima, e a caminhonete ainda jaz no estacionamento em ruinas. 

*****

Algumas considerações: 

Algum tempo atrás passei a seguir alguns canais que narravam artigos da SCP Foundation - não tenho idéia de quanto essa coisa é conhecida, mas ela existe e tem uma grande quantidade de fãs mundo afora, que ampliam, desenvolvem e traduzem (inclusive pra português) a coisa toda de modo organizadamente caótico. Pra quem não conhece, vale a pena pesquisar. É uma toca de coelho interessante. 

Eventualmente, graças ao algoritmo do youtube, passei a receber recomendações de canais que narram creepypastas sem ligação com a SCP (ao menos que eu saiba), ouvindo áudios de histórias de terror/horror enquanto "descanso" entre um audiobook e outro. Até agora, nunca tinha realmente parado pra escrever nada, e honestamente, nunca achei que ia. 

Mas esses dias me deparei com um audio de uma crrepypasta chamada "campfire", que vou lincar aqui. Não é um conto particularmente inspirador, mas por algum motivo - talvez pelo final ter sido pouco satisfatório - eu fiquei pensando "e se". Especificamente "e se num desses contos, ao invez de um sujeito comum, o mostro acabasse encontrando um esquisito bem preparado?" 

A idéia, obviamente, não tem nada de original. Supernatural tá aí com sei lá, 15 temporadas fazendo exatamente isso... Mas eu decidi, como exercio de escrita (e também de tradução, em parte) escrever uma versão alternativa pra essa creepypasta em particular. Porque pareceu divertido. 

Percebam que várias passagens são traduções literais - eu realmente só traduzi o texto original do autor, na cara dura, mesmo.  Cópia descarada. Clonagem. Plágio! O objetivo era me exercitar, mesmo, não criar uma história memorável, e como eu tou dizendo aqui, os lorus são todos do autor original, Daniel Martins. 

Apesar disso, eu gostei do resultado final, e embora a intenção original não fosse publicar, eu dicidi que valia a pena. Então estou deixando aqui um aviso bem grande que eu basicamente plagiei o trabalho do Daniel Martins, copiando a idéia central e literalmente traduzindo ipsis literis várias passagens. Se gostar do texto, vai lá no link do original, dá uma avaliação pro cara, faz um comentário e sei lá, "me entrega" e diz que um brasileiro pé-rapado escreveu uma versão em português da história dele, mudando totalmente o final e transformando o troço numa fanfarronice. 

De todo modo, espero que a leitura tenha sido interessante. 

Post Scriptum: Honestamente, agora que terminei de escrever esse troço, me dei conta que seria uma história interessante do Mário, o  detetive sobrenatural que o Fábio Ochôa e/ou o Marco Antônio Collares criaram décadas atrás. 

Enfim, sei lá. 

E fiquem longe de Devil's Springs! 

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Equal Rites

 


Terceiro livro da série de Terry Pratchet sobre a Discoterra (eu realmente gostei do som da palavra!), Equal Rites é o primeiro livro da série especificamente focada em bruxas dentro do cenário. 

O título faz alusão ao termo "Equal Rights", já que é basicamente um livro sobre uma personagem querendo ter os mesmos direitos de, bom, outros personagens. No caso, uma Bruxa de criação decide que quer se tornar um Mago. Veja, na Discoterra, BruxAS são Bruxas e MagOS são Magos. Perceba que há uma exigência de gênero aí - duvido que Pratchet entre nas questões de "fluiditismo" (??) de gênero mais adiante na série, mas não me surpreenderia... Mas, por uma dessas coisas bizarras que acontecem na Discoterra, o nascimento de um Mago, previsto e premonizado com precisão pelos estudiosos, acaba se revelendo o nascimento de uma Bruxa. E agora a pobre Eskarina (que nome maravilhoso, alias!) precisa lidar com o fato de que é um Mago e também uma Bruxa - e o que fazer com ambas as tradições e seus ensinamentos extremamente dissimilares! 

Um livro bastante divertido, embora menos engraçado e mais contemplativo do que o primeiro. Tem vários momentos que me fizeram rir bastante, mas ao mesmo tempo permite refletir no status quo da Discoterra de modo mais profundo. Eu fico honestamente embasbacado como, num cenário totalmente caótico como o que Pratchet criou, ainda há lugar para senso comum em alguns casos - e, de fato, esse é um dos poucos fatores de descontentamento pra mim nos livros até aqui. Veja: as regras de física, geografia, história e, bom, tudo o mais, funcionam de forma bastante diversa na Discoterra. A luz é mais lenta, os planetas literalmente são planos, a magia e a Morte são reais, há multiplos universos adjacentes... Tudo isso comprovado. Mas ainda assim, o senso comum dos habitantes locais - mesmo sendo totalmente desconsiderados em termos gerais - funcionam exatamente como na nossa realidade, o que, pra mim, não faz o menor sentido - o que, por sua vez, é um fator bastante interessante dentro de um cenário, em essência, nonsensical (na~otenho idéia se existe um termo que descreva isso bem em bom português, então vou manter o termo em inglês, apesar da minha relutância geral em fazer isso).  

Como um todo, é um bom livro, com uma trama interessante, divertida e muito bem desenvolvida. E apesar de sentir uma certa falta de Rincewind e seu comportamento... Errático, Eskarina é uma personagem bastante interessante e eu mal posso esperar pra ler outros livros com ela! 

Leitura fortemente recomendada! De fato, esse livro é o primeiro da série de Witches Novels da Discoterra, então ele pode perfeitamente ser o início da jornada pelo cenário de Pratchet sem nenhum problema! 

Mort


 Mort é o quarto livro da série escrita por Terry Pratchet sobre a Discoterra e o primeiro do que é considerado a série de livro sobre Death, um dos personagens da Discoterra merece uma série pra pra chamar de sua. O Mort do título, no caso, é o aprendiz de Death - que aparentemente decidiu que é hora de se aposentar. Não tenho idéia de onde vão os próximos livros, mas tendo a acreditar que serão mais focados em Death do que em Mort - que sendo o protagonista desse livro serve como uma espécie de guia pro leitor entender a idéia geral de Death e seu papel na Discoterra. 

O livro não me enmpolgou muito, e embora tenha seus momentos, é, honestamente, o menos inspirado da série até aqui (tendo lido só quatro de... bom, um monte, isso não significa muito). Mort (tanto o personagem quanto o livro) são desinteressantes em geral, e embora haja excelentes piadas aqui e ali, a história (e o personagem) basicamente se arrastam de um capítulo pro outro, sem muito sentido dado às suas ações. Honestamente, o livro me interessou tão pouco que fiz várias "pausas" na escuta pra ouvir coisas aleatórias - como um documentários de duas horas sobre a ascensão, história e atual estado das NFTs e uma crítica sobre as repercussões sobre o cancelamento de Lindsay Ellis [ que eu não tenho idéia de quem seja....]  de um canal cujo conteúdo em considero, em geral, duvidoso. Como dá pra ver, eu não estava realmente empolgado com o livro... 

É, essa é uma resenha curta e sem sal. Mais ou menos o que achei do livro. 

Tenho esperanças de que os próximos volumes da série serão melhores. 


sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Mechwarrior - Ghost of Winter


Ghost of Winter foi um de dois audios que um canal de youtube produziu transformando em audio um livro sobre Mechwarrior (o RPG baseado no clássico jogo de tabulero, battletech) - o outro, Ideal War, eu já resenhei em outra postagem. 

Mechwarrior também é o título de uma franquia de jogos eletrônicos com inúmeros títulos (tanto single quanto multiplayer), mas os romances (mais de 100 deles) foram produzidos como conteúdo adicional ao RPG, e embora todos eles tenham um universo compartilhado, os jogos eletrônicos, do RPG e do jogo de tabuleiro se passam em eras diferentes, e os romances se focam na era clássica e na Era das Trevas, enquanto os jogos (tanto eletrônico como os de tabuleiro) misturam mechs de várias eras diferentes, e o jogo online se passa na era das invasões dos clãs. 

E sim, na imagem de capa diz que é baseado nos jogos eletrônicos, mas essa capa é da reedição, e queria pegar carona no sucesso do jogo online - eu não consegui encontrar a capa original sem essa propaganda com uma boa resolução, infelizmente... 

Battetech também tem uma animação no meio da década de 90 e tanto esse título como Mechwarrior tem séries de quadrinhos que se passam em diversas eras diferentes. 

E sim, eu provavelmente deveria ter falado sobre tudo isso na resenha do primeiro livro que fiz do cenário, mas antes tarde do que mais tarde, como diz o ditado. 

Agora, sobre este livro específico. 

Ghost of Winter se passa em um pequeno planeta gelado chamado Kore, na periferia da esfera central da Terra. O planeta mineiro tem pouco valor estratégico, mas como possui minério em abundância e uma conformação geológica que produz uma série de anomalias geotérmicas, a Corporação Mineira de Alfin (proprietária do planeta) mantém uma Lança de mechwarriors no local para proteger as instalações de mineração e o pequeno laboratório supervisionado pelo doutor Hidoshi Kintaro, cujo filho, Sturm, um mechwarrior em treinamento, é o protagonista do livro. 

A unidade de mechwarriors do planeta, composta pelo sargento Kenner (um veterano de guerra que participou das guerras contra os clãs sob o comando de Jenna Kintaro, máe de Sturm) conta com dois mechwarriors experientes e mais dois pilotos em treinamento - Sturm e Volker, ambos jovens nativos de Kore e sem qualquer experiência em combate real.

Quando o planeta é atacado por uma Lança de piratas liderada por Susie "one-eye" Ryan, os defensores, pegos desprevenidos e sem prática em combate são rapidamente derrotados, embora Sturm consiga escapar para os hermos gelados dde Kore - onde descobrirá alguns segredos sobre o planeta e seu passado, e precisará derrotar os piratas para proteger seu pai e seus amigos. 

Não é exatamente a mais original das histórias, embora, obviamente, o cenário ajude bastante, adicionando várias informações sobre a política e história dos jogos na trama. O ritmo acelerado do livro - que não se preocupa em dar informações muito detalhadas sobre as possíveis "partes chatas" da história, se concentrando apenas na ação, planos mirabolantes e nas agressivas interações entre os personagens também ajuda a manter o interesse no livro ao longo de toda a estória, sem pausas longas entre as muitas cenas de ação e algumas reviravoltas previsíveis mas bem executadas. 

O ritmo, no entanto, também é um fator detrimental ao livro, já que a trama é tão recheada de combates que o confronto final entre Sturm e os piratas não tem tanto impacto quanto poderia. 

Ainda assim, daria um excelente filme de ação! 

Para fãs de Battletech ou Mechwarrior (jogo de tabuleiro, RPG ou mesmo jogos eletrônicos ) é um prato cheio com explicações detalhadas sobre mechs, armas, estratégias de combate amarrados de forma extremamente eficiente nas cenas de combate (a gente quase consegue ver as miniaturas se movendo nos mapas e os resultados das rolagens de ataque!). 

Para quem não é familiarizado com o cenário, talvez o livro seja de pouco interesse, mas ainda é um bom livro de ação com um cenário conciso e combates bem escritos. 

Como fiz com Ideal War, vou deixar aqui o link para o vídeo no youtube onde o livro pode ser ouvido na integra - com uma narração e edição bastante competentes! 



Post Scriptum: Espero que o Rageaholic volte a produzir audiobooks (de mechwarrior ou de qualquer outra franquia) porque a produção dele é excelente e a narração é indistinguível de um profissional - embora eu não tenha me interessado por mais nada do canal do sujeito, só pela esperança dele lançar mais audiobooks já valeu a inscrição! 

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

The Colour of Magic & Light Fantastic


E então tomei vergonha na cara e decidi - antes tarde do que mais tarde - desbravar o Mundo Disco. Mundo do Disco? Discomundo? Discoterra...? Não tenho muita certeza de como traduziria o nome da série, pra ser honesto. 

Já tinha, como todo bom leitor de fantasia, ouvido falar sobre essa série, e já tinha uma vaga idéia do que se tratava. De fato, conhecia alguns dos personagens - como Cohen, o Bárbaro. E a Bagagem. Ah, a bagagem... 

Mas pra quem não conhece, vamos do começo - e pra quem conhece, sejam pacientes e leiam pra poder me corrigir caso eu tenha entendido alguma coisa errada (a melhor maneira de fazer alguém ler alguma coisa é pedir pras pessoas te corrigirem, porque daí elas vão querer inflar o próprio ego e pra isso vão prestar muita, muita atenção no texto. Isso é Miologia pra iniciantes, caso vocês precisem saber. Mas Miologia é um assunto pra outra hora). 

Onde eu estava? 


Ah, sim. Discoterra (me afeiçoei ao nome, vou adotar!)  consiste em um largo disco (completo com uma borda-do-mundo e consequentemente uma grande cachoeira circular) que descansa nas costas de quatro imensos elefantes que, por sua vez, estão sobre o casco do Grande A'Tuin , uma Chelys galacticaas (ou uma gigantesca tartaruga espacial, pros menos cultos entenderem...) que lentamente navega pelo infinito. 

Dramático, não é? 

Bom, é nesse cenário que encontramos o Mago Rincewind, cujas capacidades mágicas se resumem à uma única magia - uma das Oito Magias, é bem verdade, o que é consideravelmente notável - que ficou, de certa forma, presa em sua cabeça. E sendo esta magia particularmente prodigiosa, outras magias tem medo dela e se recusam à permanecer na memória de Rncewind. E como o próprio mago não tem ideia do que a magia é capaz de fazer, ele não tem qualquer intenção de dize-la. Então apesar de ser, para todos os efeitos, um mago, ele não é um bom mago, por qualquer definição da palavra. Mas Rincewind, por falta de capacidades mágicas, se tornou muito bom em lidar com pessoas. E graças à isso ele acaba se encontrando - ou, na verdade, sendo ejetado e rota de colisão - com Twoflowers, um autentico turista do Império Agateano. E este turista tem uma Bagagem. Ah, sim, ele tem uma Bagagem... Rincewind parte então em sua missão de mostrar ao Turista a grande cidade de Ankh-Morpork em toda sua fétida glória. 

Obviamente, eles se metem em diversas enrascadas e eventualmente acabam viajando muito além da cidade até (literalmente) a borda do mundo. 


Há, sim, outros livros da ´serie que retratam as desventuras de Rincewind - embora eu não esteja certo sobre TwoFlowers. Existe, inclusive, um organograma de leitura adequado a cada tema - incluindo indicações do próprio Pratchett de por onde começar a série, que eu vou adicionar aqui caso alguém queira ler os livros em uma ordem menos caótica. Eu decidi, no entanto, ler a série em ordem de publicação, dividindo as publicações em grupos por assunto. Assim, estes dois primeiros volumes da série foram sumarizados juntos sob o rótulo de Rncewind Novels e o terceiro volume, Equal Rites, será o primeiro sob o rótulo Witches Novel. 

Confuso, não? Sim, essa é a idéia! 

Bom, essa não foi a melhor das resenhas - de fato, eu sequer vou adicionar notas pra mim mesmo - porque, honestamente, estes dois volumes são bastante frenéticos e muita coisa acontece, e tentar sumarizar mais do que "Um mago, um turista e uma Bagagem vivem altas aventuras na Discoterra" daria mais trabalho do que eu posso me dar ao luxo de desempenhar no momento. Mas eu espero que seja de alguma ajuda. Talvez. Ou não. 

Enfim! 

São ótimos livros, e eu me diverti bastante ouvindo ambos - embora, honestamente, o segundo tenha me feito rir mais, talvez por eu ter me acostumado com a narrativa algo convulsa de Pratchett (que, admito, muito me agrada). 

Leitura fortemente recomendada! 

Post Scriptum 1: TwoFlower não tem literalmente quatro olhos como nas ilustrações de ambas as capas. Josh Kirby, o capista, interpretou erroneamente a passagem que que Pratchett descreve o turista como tendo "quatro olhos" de forma literal. O que, coincidentemente, foi o mesmo que acontece comigo! De fato, quando eu olhei as capas, eu pensei "Ah, é assim que são os quatro olhos do Twoflowers!" porque fiquei bastante confuso quando ele descreveu ele tendo quatro olhos da primeira vez.  

Post Scriptum 2: de forma semelhante, Pratchett descreve Twoflowers com uma "vestimenta espalhafatosa", e Kirby desenhou ele em ropas de bufão. Eu imaginei a exata mesma coisa. Acontece que o autor queria transmitir a idéia de que, na verdade, o turista tinha, exatamente, as características de um turista, incluindo uma camiseta com estampas havaianas. Imagens na rede me deixaram bastante confusos porque embora eu tenha imaginado Twoflowers de forma bastante semelhante à representação de Kirby, quando eu fui procurar por imagens dele na rede, me dei de cara com um turista bastante genérico. Que, na verdade, era exatamente a idéia que Pratchett tinha em mente com sua descrição. 

Rincewind, o mago, e Twoflowers, o turista. 
Espera! Tem um filme sobre os livros?!?